Pesquisar seu artigo aqui

vendredi 27 avril 2018

OS QUATRO MOMENTOS-CHAVE DO INÍCIO DO FENÔMENO DE VIOLÊNCIAS SOCIAIS E CONFLITOS ARMADOS EM CITÉ SOLEIL


Resumo

O fenômeno de conflitos armados e violências coletivas em Cité Soleil – apesar de serem vividos e famosos – são objeto de poucos estudos. As pessoas ignoram como ele começou. No entanto, todo fenômeno tem um início. É este início que pode permitir compreendê-lo na sua complexidade e integralidade. É para responder a esta necessidade que, a partir de vários momentos de observações profanas acrescentadas recentemente às pesquisas sociológicas e etnográficas, apresentamos aqui quatro momentos-chave suscetíveis de explicar as trajetórias dos conflitos violentos em Cité Soleil e entender por que eles se degeneram tanto. Esta tentativa objetiva provocar uma reflexão crítica sobre a degenerescência social deste município.

Palavras-chave: Violência social. Conflito armado. Cité Soleil.

Abstract
               The phenomenon of armed conflicts and collective violence in Cité Soleil - despite being lived and famous - are the subject of few studies. People ignore how it started. However, every phenomenon has a beginning. It is this beginning that can allow you to understand it in its complexity and completeness. It is to respond to this need that, from several moments of profane observations recently added to the sociological and ethnographic researches, we present here four key moments capable of explaining the trajectories of the violent conflicts in Cité Soleil and to understand why they degenerate so much. This attempt aims to provoke a critical reflection on the social degeneration of this municipality.

Keywords: Social violence. Armed conflict. Cité Soleil.


Introdução

As violências coletivas e os conflitos armados que paralisam Cité Soleil durante acerca de 30 anos permanecem ainda em estado latente. Podemos reparti-los em várias gerações distintas por causa da categoria social que neles se envolveu, ou ainda por causa da configuração social dos grupos armados. Mas, escolhemos dividi-los em quatro momentos históricos chaves. Esta divisão obedece a um critério socio-histórico porque – como vamos ver mais adiante – a cada geração temos um tipo de conflito. O que nunca mudou é as condições sociais e econômicas de vida dos habitantes desta zona populosa. São adolescentes e jovens da faixa etária média de 10 a 15 anos. Com efeito, de 1990 a 2015, é difícil lembrar subsequentemente todas as gerações dos grupos armados que se sucederam e que manterem este subúrbio num clima de grande tensão de conflitos e de violências durante todo este tempo. O objetivo deste artigo é apresentar e analisar as principais etapas que levaram à degenerescência social dos conflitos armados e das violências coletivas em Cité Soleil. Par isso, vamos estudar quatro momentos históricos fundamentais no âmbito dos acontecimentos deste fenômeno e fazer, para finalizar, um balanço geral do mesmo fenômeno. Mas, antes de ir direto ao assunto, é fundamental proceder por uma abordagem sociogeográfica que permitirá ao leitor entender a organização socioespacial, administrativa e política do município de Cité Soleil.

1.      Cité Soleil: Sociogeografia e geolocalização das principais áreas políticas, econômicas e sociais

Por sociogeografia ou geografia social da violência e conflitos armados devemos entender esta parte da geografia que se interessa pelo estudo dos grupos sociais nas suas relações com o espaço que eles ocupam. Este método permite localizar os principais centros em que este fenômeno estava acontecendo, isto é, suas áreas de comando, de alimentação, de produção ou ainda de reprodução. Este método é também importante para distinguir zonas vermelhas daquelas mais ou menos tranquilas. Pela expressão berços de conflitos nos referimo-nos aos espaços geográficos mais expostos à proliferação dos grupos armados e à degenerescência das violências. Assim, a disciplina sociogeográfica nos possibilita de ferramentas para identificar as áreas que reúnem todas as condições sociais, culturais, políticas, econômicas, psicológicas, possivelmente, ambientais de surgimento dos conflitos armados e das violências coletivas sem, no entanto, querer dizer que algumas zonas geográficas são predeterminadas a estas situações sociais catastróficas.

1.1.Geolocalização de Cité Soleil

Situado ao norte da capital, Porto Príncipe, a 5,6 km do centro da cidade, o município de Cité Soleil, o mais populoso de todos os subúrbios da área metropolitana, abrange uma superfície total de 22 km². Ele se compõe de duas secções comunais Varreux I e II, trinta e quatro bairros, uma população acerca de 265.072 habitantes, majoritariamente urbana (IHSI, 2015). A maioria vive numa pobreza extrema com menos de 1 U$ por dia. Os limites territoriais de Cité Soleil não são bem definidos e isso engendra conflitos territoriais. Um funcionário da Prefeitura nós contou um conflito que ocorreu entre as autoridades municipais de Cité Soleil e as empresas por causa dos impostos e taxas. Além disso, KOTELAM – uma caixa popular de poupança e de empréstimo – decidiu abrir uma sucursal na localidade de Damiens, zona norte, em frente da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária na parte ocidental do município. Isso provocou uma discussão violenta entre os agentes por interim deste município e os dos municípios de Croix-des-Bouquets e de Tabarre a fim de determinar qual autoridade municipal deveria cobrar desta instituição o  pagamento das obrigações tributárias. Casos como conflitos por competência territorial, competência jurídica e competência judiciária são muito frequentes na sociedade haitiana. As autoridades governamentais competentes têm que resolver este problema.

Além disso, indústrias, empresas, residências, lojas e centros comerciais que, segundo as delimitações territoriais, deveriam estar sob a jurisdição de Cité Soleil, são cobrados pelos agentes fiscais de Tabarre ou de Croix-des-Bouquets. Daí um conflito territorial que não é nem silencioso nem barulhento, mas presente no cotidiano social e político das autoridades e está acontecendo por causa de uma desordem generalizada na delimitação das comunas. No entanto, ele não preocupa ninguém tampouco os governantes. Alguns dos municípios foram criados por causas essencialmente políticas, ideológicas e afetivas para agradar uma população ou satisfazer um grupo peculiar sem que estes respondam aos critérios de infraestrutura e às condições sociais e ambientais necessárias.

Uma explicação deste problema se encontra na Lei de 2002, criadora do município de Cité Soleil e emendada pela Lei de 2004 sob o governo de transição. Ambos as leis têm uma falta enorme de clareza sobre as zonas e bairros que pertencem ao município de Cité Soleil e seus limites territoriais bem definidos. No entanto, de acordo com a Lei de 2004, Cité Soleil está limitada ao norte pelo rio cinzento e Damiens, ao sul por Carrefour Aviation – recentemente renomeado Carrefour Jean-Jacques Dessalines cujo decreto é desconhecido –, ao este por Wharf Jérémie e a baía de Porto Príncipe que se estendem ao longo dos mares até Wharf e o Mar do Caribe passando por Bélécou, ao oeste por Delmas, Simon Pelé, Cité Militaire e estrada do aeroporto Toussaint Louverture onde se concentra o parque industrial.

1.2.Cité Soleil e suas principais instituições da administração pública

As zonas mais afastadas como Sarthe, Terre-Noire, Blanchard, Rapatrié e Duvivier – para citar apenas algumas – são, aparentemente, percebidas como áreas rurais da comuna habitada por indivíduos com capacidades econômicas muito médias. Mas, na verdade não são. Esta abordagem sociogeográfica de Cité Soleil está nos permitindo compreender que, apesar do empobrecimento, da miséria e da reputação de zonas de violência e de conflitos, este município não é violento em sua totalidade, globalidade e integralidade, isto é, a violência e o conflito intergrupos se distribuem entre uma dúzia dos 34 bairros que o compõem. Trata-se então de um terço do município que se mergulha nos conflitos intermitentes sem contar os casos isolados de violências conjugais, sexuais, de gênero não repertoriadas noutros bairros menos conflitantes. É uma representação de 35,29 % da superfície total do munícipio. É muito por um município tão pobre, economicamente dependente das receitas do Estado central e não criador de riquezas e de empregos. E, como veremos mais adiante, mesmo dentro desses berços de conflitos, há zonas mais beligerantes e guerreiras do que outras. Por causa da história violenta, influência social, afluência, quantidade de soldados, capacidade de lutar, número imponente de grupos armados, um bairro pode, naturalmente, impor sua vontade a outro.

Sabemos que no espaço urbano se concentram o poder público, político e administrativo, as atividades sociais, econômicas, culturais, educativas e artísticas com maior alcance e intensidade, onde se encontram as universidades, os grandes centros comerciais, hospitais, bancos e meios de comunicação, onde a mobilidade social é mais intensa, onde a maior parte da vida social, econômica, cultural e política dos indivíduos está agitada. O caso de Cité Soleil é um pouco diferente: sua ruralidade e sua urbanidade se confundem. Não tem como separar geograficamente o urbano do rural e vice-versa, como isso acontece para Gonaïves, Cap-Haïtien, Cayes, Jacmel e Croix-des-Bouquets. O município é quase 100 % urbano. Com isso, os habitantes de Cité Soleil vivem no coração das áreas urbanas e não têm, absolutamente, nada assemelhado a uma vida rural propriamente dita.

Com efeito, Sarthe e Cazeau são, praticamente, percebidas não como zonas rurais, mas como áreas urbanas recuadas das zonas conflitantes e, além disso, designam o local do poder político e administrativo, da Subdireção Geral dos Impostos. Mas, as atividades comerciais (grandes ou pequenas) se concentram entre Wharf Jérémie, Wharf, Carrefour Aviation, Damiens, Station Gonaïves e o mercado comunal de Brooklyn sem contar os vários pequenos negócios informais dispersos aqui e ali. Assim, embora não seja fácil distinguir entre rural e urbano, embora o município esteja localizado na periferia norte de Porto Príncipe com o mar caribenho por limite, apesar das dificuldades de situar claramente seus limites geográficos, apesar de não poder identificar grandes centros comerciais, culturais e artísticos, finalmente, apesar de ter um comércio informal dominante, o município permanece um espaço muito urbano. As violências coletivas e os conflitos armados que ele está sofrendo são também urbanos e se concentram em alguns bairros específicos.

A administração municipal é instala então em Sarthe, localidade do noroeste menos exposta aos conflitos armados frequentes e repetitivos. Pelo passado, esta administração estava no centro das zonas conflitantes entre Cité Lumière – alvo de vários ataques – e Boston – o bairro mais beligerante. A razão principal da sua deslocalização para Sarthe, um bairro mais seguro, tem a ver com os perigos  iminentes dos conflitos armados. O Tribunal da Paz e o Oficio do Estado Civil estão na zona sudoeste da Estrada Nacional # 1. Nesta mesma estrada Nacional # 1, há, ao sul, a encruzilhada do cemitério de Drouillard, ao norte a estação Gonaïves – uma espécie de rodoviária como no Brasil. Ambos são munidos de uma delegacia de polícia. Ao lado de uma torre de água na parte leste da entrada da comuna se encontra uma subdelegacia de polícia, alvo de numerosos ataques violentos por indivíduos armados. Pelo Boulevard des Américains, também conhecido como 4 encruzilhadas ou Route 9, há, um pouco mais ao leste, escolas e instituições religiosas, entre as quais a Igreja Católica da Imaculada Conceição e a Escola Primária Nacional de Cité Soleil, ao oeste a Escola Secundária Nacional de Cité Soleil até o mar onde se encontra o Wharf equipado também de uma outra subdelegacia de polícia e uma única instituição mediática: Rádio Boukman.

Na parte sul de Boulevard des Américains, encontramos o recém-renovado Wharf Jérémie e o cais onde os barcos se acostam e as companhias de petróleo aprovisionam-se em gás a acerca de cem metros de Bélécou – um subúrbio do sudeste de Cité Soleil. Ao norte está o antigo mercado comunal transformado em uma base militar pela Minustah, onde também estava localizada a única delegacia de polícia. Atualmente, todo o espaço é ocupado pela Unidade Departamental de Manutenção de Ordens (UDMO) – uma das unidades da PNH – vista a retirada progressiva desta força da ONU. Finalmente, mais ao norte em direção à Côtes des Arcadins, Route 9, há uma terceira delegacia de polícia localizada entre Rapatrié, Truitier e Duvivier, ao noroeste do município.

1.3.Geolocalização das áreas de conflitos armados

O cruzamento Boulevard des Américains ou Boulevard Soleil, é também chamado 4 cruzamentos porque permite localizar os 4 pontos cardinais de Cité Soleil do norte ao sul, do leste ao oeste passando pelo centro, e ter uma visão global da zona. Este cruzamento é extremamente estratégico pelas seguintes razões. Inicialmente, este cruzamento conecta Cité Soleil com os dois principais polos atrativos do país: polo norte considerado como pulmão turístico do país e polo sul onde se encontra os centros comerciais e as companhias de petróleo. Em segundo lugar, desde a fundação de Cité Soleil, este mesmo cruzamento divide o espaço de conflito do município em duas partes ampla e categoricamente opostas e antagônicas, a saber, Alto-Soleil e Baixo-Soleil onde o alto representa a zona superior ao leste e o baixo a zona inferior ao oeste.

O terceiro fator é que este cruzamento constitui desde sempre o centro dos conflitos intermináveis entre nèg anwo kont nèg anba, das confrontações violentas entre grupos armados e policiais. É, portanto, a fronteira virtual e real que separa as principais zonas de conflito. O quarto aspecto estratégico desta encruzilhada é o fato de simbolizar a área central das atividades comerciais onde tem o maior mercado público do município. Historicamente, além dos vários confrontos violentos entre as bandas armadas rivais nos últimos vinte anos, foi neste cruzamento que, pela primeira vez, uma multidão em júbilo celebrou sua suposta vitória sobre os policiais em 1995, quando o famoso “Exército Vermelho” foi criado (FABIEN, 2017, p. 23-24). O Alto-Soleil está localizado na zona leste do Boulevard des Américains e se estende até Bélécou passando por Soleil 6, Haut-Boston e Bas-Boston, 3BB, 1º e 2º Cité, Cité Lumière, Rue Volcy, Croix Bleue e Projet Drouillard. O Baixo-Soleil começa a partir do mesmo Boulevard des Américains na zona oeste, desce para Wharf, cobrindo as áreas como Brooklyn, Soleil 4, 13, 15, 17, 19, Ti Haiti, Projet Linthau 1 & 2, Cité Gérard, Bois Neuf[1]. É nesta divisão que se encontram localizadas as diferentes zonas que constituem o núcleo dos centros de violências coletivas e de conflitos armados em Cité Soleil. Devemos sublinhar que os fenômenos de tal envergadura em Cité Soleil são concentrados neste espaço altamente urbano, principal centro de interesses dos grupos armados. 

Se for preciso recortar este mesmo interior desta área sociogeográfica de conflito, vamos ver que, de um lado, existem alguns pontos estratégicos de conflitos como, por exemplo, este famoso cruzamento Boulevard des Américains, Carrefour Million que separam Bois Neuf e Projet Drouillard, sem esquecer a estrada Nacional # 1 da zona norte em frente de Boston, que as pessoas chamam também Carrefour Boston. Do outro lado, existem algumas zonas mais violentas do que outras, ou seja, aquelas que têm os grupos armados mais perigosos e em que as rivalidades violentas são mais frequentes. Estamos falando dos bairros como Boston, Bois Neuf, Soleil 17 e 19, Projet Drouillard, Cité Lumière, Ti Ayiti, Cité Gérard, Brooklyn, Bélécou, que, desde início, fazem parte da lista preta das localidades de proliferação dos grupos armados.

Se cada bairro tem sua própria banda armada, é para proteger e defender seus interesses, ter sua parcela do bolo quando necessário, não se submeter à boa graça dos outros, por fim, poder controlar seu próprio espaço. Cité Soleil é um espaço de rivalidade e de competição entre os grupos armados que buscam controlar este espaço. Ele representa um grande centro de interesse econômico para eles e para os políticos e empresários que os utilizam para criar insegurança e instabilidade quando estiveram insatisfeitos de um regime. Às vezes, eles não precisam de um apelo dos manipuladores, eles podem criar sua própria insegurança quando estiveram também com raiva contra esses manipuladores. Enfim, Cité Soleil é um circulo vicioso de violências e de conflitos que permite entender como um sistema de exclusão social funciona assim como o paradoxo da sociedade haitiana, produtora de pessoas violentas e criminosas.  

Mesmo se às vezes as violências e os conflitos assemelham a uma loucura mortífera, uma criminalidade de alta intensidade, uma guerra fratricida infinita, ou, pareçam desnecessários e híbridos, eles escondem importantes interesses sociais, econômicos, políticos e financeiros tanto para os atores como para os manipuladores intelectuais. Seria um erro grotesco acreditar que esses jovens são loucos para se matar entre si por nada. Esses interesses não são coletivos, mas individuais ou pessoais. A violência se torna uma espécie de competição entre os diferentes grupos armados a fim de obter sua modesta porção em detrimento do resto da comunidade. Daí a perigosidade de morar e frequentar essas localidades. Assim, o habitante de Cité Soleil é como um prisioneiro da sua própria residência. Uma exclusão social total do resto da sociedade.

Acabamos de demonstrar que as violências coletivas e os conflitos armados se concentram nas áreas urbanas estratégicas – as mais pobres, insalubres, inacessíveis e vulneráveis do ponto de vista ecológico e ambiental – controladas por sujeitos armados. Abrangendo uma grande parte da comuna, essas dezenas bairros – mesmo que simbolizem o bastião dos conflitos armados – não são a representação exclusiva da cidade inteira. As áreas menos conflitantes, como Sarthe, Terre-Noire, Blanchard, Rapatrié e Duvivier – para citar apenas algumas – não são, no entanto, totalmente, livres de violência social. As últimas rivalidades intergrupos de 2015 opuseram Bois Neuf e Projet Drouillard no espaço chamado Carrefour Million. Assim, as violências e os conflitos acontecem, geralmente, nas áreas sociogeográficas mais pobres de difícil acesso às forças policiais. Vamos agora estudar cada geração desses conflitos com suas características sociais. 

2.      As diferentes gerações de conflitos armados em Cité Soleil e suas particularidades sociais

As primeiras situações conflituosas e violentas começaram em 1967, data da fundação da cidade e se estenderam até 1986 quando o ditador Jean-Claude Duvalier era compelido de abandonar o poder sob as pressões populares para se exilar na França. O segundo momento vai de 1987 a 1994, marcado, na escala nacional, por golpes militares sucessivos e perseguições políticas, em Cité Soleil, pelo surgimento daquela famosa organização chamada «Exército Vermelho» e altercações frequentes entre policiais e civis na madrugada do golpe de 1991 contra o presidente Aristide. Esta segunda geração de conflito e de violência se termina com o retorno em 1994 do mesmo. A terceira geração abrange o quinquenal do presidente Préval até o período da reeleição, em 2001, do Sr. Aristide nas eleições de 2000 vigorosamente contestadas pela oposição e por vários setores da sociedade política. Enfim, o último momento – o mais longo de uma duração de 14 anos – começou exatamente a partir do segundo mandato presidencial do Sr. Aristide em 2001, e se estende até o final de 2015.

Cada uma dessas gerações tem suas particularidades sociais. Se a primeira era de ordem interpessoal e interindividual por causas extremamente ligadas às necessidades sociais e alimentícias primarias, a segunda era fortemente dominada por caráteres políticos. Na terceira geração, os conflitos armados e as violências coletivas eram menos agitadas entre os grupos e as forças policiais. Isso pode ser explicado pelo comportamento e temperamento do presidente Préval que era um homem muito pacificador. Mas, as coisas se pioraram nos anos 2000: as rivalidades entre grupos  armados se intensificavam, surgiram as OP que se confundiam com os grupos armados, as violências sociais aumentaram consideravelmente, as confrontações violentamente físicas entre bandas armadas e policiais se tornavam uma rotina. 2004 a 2007 corresponde ao período da grande turbulência na escala nacional de uma paralisação quase geral das atividades em Cité Soleil.

2.1.Primeira geração de 1967 a 1987: Conflito e violência de natureza interindividual e interpessoal: Ambiguidade e pacificidade

As violências e os conflitos sociais que Cité Soleil experimentou desde sua fundação até o fim, em 1986,  das práticas ditatórias do regime Duvalier foram, em primeiro lugar, fortemente marcados pelos seus caráteres interindividual e interpessoal, em segundo lugar, pela violência política e sexual dos Tontons Macoutes. Este segundo tipo de violência era geral porque o país inteiro sofreu dele, então ele não era específico a Cité Soleil. Todavia, como vamos ver mais adiante, do ponto de vista de comportamento e de repercussão social, as extravagâncias e os excessos dos Tontons Macoutes tiveram grandes impactos sobre os jovens que iam formar a geração futura. Queremos enfatizar aqui os aspectos interindividual e interpessoal dos conflitos e das violências.

É necessário compreender – numa dimensão sociológica – que esta individualidade e pessoalidade desta categoria de conflito e violência em Cité Soleil se ancora no modo de vida social dos habitantes, isto é, situações sociais domésticas e familiares circunscritas numa esfera microsocial e comunitária sem caracterização coletiva são fatos sociais normais que ocorrem em qualquer determinada sociedade humana. De fato, de uma natureza pacífica enganosa, ninguém não prestou atenção a esses tipos de problemas interindividuais entre famílias, entre moradores, entre grupos amigáveis da mesma ruela ou da mesma localidade por causa da distribuição das rações alimentícias, do acesso à água etc. A probabilidade de pensar numa agravação em nível coletivo desses problemas comuns era muito reduzida. Embora os indivíduos tenham interesses divergentes e consigam resolver, pessoal e pacificamente, seus próprios conflitos, nesta comunidade os problemas sociais permaneciam gerais: educação, emprego, água, trabalho, saúde.

Esta geração de conflito tem uma dimensão biológica que consiste, isoladamente, em situação de acesso difícil ou insatisfatório às necessidades sociobiológicas mais elementares como alimentação, água, saúde e trabalho. São conflito e violência provocados pela enorme falta das ajudas sociais que nunca chegam a satisfazer a maioria: a demanda sempre ultrapassa grandemente a oferta. Há muitos indivíduos com necessidades sociais e econômicas precárias, no entanto, há muito pouco a lhes distribuir. O elemento biológico muito dominante se junta ao elemento social que faz com que não estamos falando de indivíduos com necessidades biológicas isoladas, mas de indivíduos que têm necessidades sociais comuns e que as manifestam no momento de distribuição das ajudas sociais cujos desenrolamento e fim alcançam geralmente alguma violência.

Esta violência interindividual se explica, por exemplo, pela distribuição desigual das ajudas sociais às populações vulneráveis, pela preferência de um grupo ou de uma família em detrimento do outro durante esta distribuição, pelo armazenamento indevido da maior parte dessas ajudas pelos responsáveis numa intenção de mercantilização das mesmas a fim de revendê-las no mercado a um preço baixo. Isso ocorre na presença dos pobres infelizes e frustrados. Ao longo do tempo, as pessoas se tornam conscientes de serem exploradas e usadas como cobaias nestas distribuições "humanitárias" para que outros se enriqueçam acumulando suas fortunas em detrimento delas. Tudo isso gerou profundas animosidades na população de Cité Soleil.

Na dimensão social desta primeira geração de conflitos e violências, temos um povo que, apesar do seu analfabetismo, estava ciente que luta por necessidades sociais justas e válidas mas insatisfeitas. Nos ano 80-90, os programas sociais eram frequentes e organizados através das organizações sociais que serviram de intermediários. Os representantes dessas organizações conseguiram dialogar diretamente com o governo quando as coisas se deram mal e defender os interesses da população. A partir daí, as manifestações populares pacíficas constituíam um espaço de interação sociopolítica, embora, em algum momento, este espaço de diálogo se tornou surdo e mudo às demandas da população. Portanto, começaram as deteriorações das relações sociais e políticas, e, ao longo do tempo, a intermediação democrática não é mais ações coletivas, mas chantagens políticas com sua pequena dose de violência. Apesar disso, estas manifestações podiam ser chamadas de movimentos sociais no sentido das argumentações de Alain Touraine (1968, 1982). Para o autor, movimentos sociais são ideologicamente orientados para os objetivos que eles perseguem de acordo com sua situação. Não se trata de multidão sem objetividade e ideologia, mas de ações coletivas orientadas por ideias e ideologias defendidas num espaço de dialogo e de interação social. É uma arena socio-democrática que é só possível quando o governo e atores políticos abrem o debate aos manifestantes e que estes conseguem também defender suas ideias e seus interesses. É o lugar por excelência de expressão, de veiculação e de validação das palavras dos mais pobres. Nesta época em Cité Soleil, não há dúvida de que as violências e os conflitos eram essencialmente a expressão manifesta da insatisfação das necessidades sociais mais básicas das comunidades, que reivindicaram seus direitos cumprindo seus deveres democráticos, saber, os movimentos sociais. Nesta época também, no espaço sociopolítico as organizações sociais eram fortes.

Estamos concluindo esta primeira parte com uma breve explicação do aspecto pessoal e interindividual caracterizado por conflitos isolados entre pescadores, violências fracas entre famílias, discussões agressivas entre pessoas nas localidades de acesso a um serviço comunitário e público, a água[2], por exemplo. Os conflitos e as violências poderiam ocorrer também por causa de uma criança turbulenta ou rude. Nas longas filas de atendimento aos kits alimentícios distribuídos pelo Centro de Desenvolvimento Social (CDS) de Réginal Boulos ou pela organização de patrocínios do Padre Lanaud ou Bonnhen, as violências e os conflitos eram também frequentes. Nessas filas, pequenos empurrões, brigas, querelas, grosseiras surgidas acidentalmente entre as pessoas poderiam levar a conflitos interindividuais e até interfamiliares indefinitos. Não deveria ter vergonha de dizer que em Cité Soleil nesta época as pessoas poderiam se matar por uma caixa de leite ou por um pedaço de pão, tão a situação social era catastrófica.

Uma simples agitação em uma longa fila de atendimento durante a distribuição de alimentos, pequenos mal-entendidos por causa de uma mulher, criança, animal ou objeto valioso poderiam gerar ódios contínuos, porque nesta pequena comunidade de onde iam emergir alguns surtos de conflitos armados, todos se conheceram. Essas situações socio-individuais eram até lá impermeáveis e impenetráveis a qualquer tipo de influência política, porque foram vistas como coisas normais às quais expõe toda afluência coletiva. Ninguém ficou chocado. Pois, Cité Soleil constituiu uma grande família, uma microcomunidade na qual, além dos mal-entendidos isolados, todo mundo se conhecia, se frequentava, se fazia confiança, se amava, se ajudava mutuamente, se socorria reciprocamente, se brincava com prazer e lazer. A vida comunitária era tão bem cimentada nos costumes e hábitos dos moradores que as querelas isoladas não podiam sacudi-la e eram resolvidas pacificamente.

2.2.Segunda geração 1987-1994: A intervenção do elemento político nas situações conflituosas e violentas, a permanência dos problemas sociais

Se até o fim de 1986 as violências e os conflitos sociais nos maiores subúrbios urbanos da capital fossem particularmente de natureza interindividual ou interpessoal, a partir de início dos anos noventa, estamos assistindo outras formas de violência e de conflito que começaram a surgir por causa das perseguições políticas e da caça dos grupos organizados que tentariam resistir aos regimes militares golpistas dos Attachés, Fraph e novos adeptos dos Tontons Macoutes de Duvalier que retornaram à cena política. Estamos lidando a partir deste momento com a violência política acrescentada aos conflitos interindividuais e problemas sociais não resolvidos. A degenerescência das violências e dos conflitos sociais da segunda geração era o resultado da insatisfação das necessidades sociais e econômicas básicas dos habitantes da comuna desde sua criação. Tais necessidades vêm a ser pioradas pelos fatores políticos, porque tudo se torna politizado até a miséria e a pobreza do povo. Tudo se reduz a uma espécie de politicaillerie haïtienne, ou seja, à corrupção e à traição. O que complica tudo. Inicialmente, a violência política era manifestada até sob a forma de medo provocado só pela presença dos Tontons Macoutes. Com os Attachés, Fraph e novos Tontons Macoutes ela era muito visível através das perseguições políticas sem esquecer com certeza todas as condições sociais infra-humanas anteriores.

O fato de que os políticos se convidam autoritariamente nas festinhas da miséria e da pobreza dos mais vulneráveis, nas rivalidades interpessoais sem trazer nenhum plano de mudança e de solução concreta, criou nos espíritos a confusão total entre o social e o político. Em outras palavras, as perseguições políticas que vêm acrescentando às situações de miséria, pobreza, desemprego e analfabetismo dos jovens, os incitavam à violência como expressão de demanda, de reclamação e de aspiração à uma vida melhor. Os problemas sociais não resolúveis vêm sendo recuperados pela política como um vírus, que se expressava pelo meio das perseguições. Esses problemas abriram o caminho para a produção de outras violências em paralelo às violências e conflitos sociais anteriores e também à politização dos mesmos. A política, ao invés de trazer soluções, vem corromper e obstruir os programas sociais que deveriam atender os desejos dos habitantes de Cité Soleil.

Estamos no coração do período pós-ditatorial duvalierista até o retorno de Aristide, em outubro de 1994, marcado por uma categoria de violências administrada sob forma de repressão política pelos governos (militares ou golpistas) provisórios sucessivos e por conflitos interindividuais que se transformaram em conflitos intergrupos. A violência política é amiúde estatal e orquestrada pelo exército[3] contra seu próprio povo sob as ordens dos governantes. Esta originou-se mais recentemente da ditadura de Duvalier que mudou completamente a configuração social e política do Estado criando um Estado contra a Nação. Um Estado que confunde Estado e Nação, que mistura interesses privados e interesses públicos, que não diferencia Governo e Executivo (TROUILLOT, 1986, p. 173-175). Um estado violento contra um povo inocente, indefensível e covarde que está querendo satisfazer seus desejos sociais preliminares. Os novos regimes militaro-golpistas não romperam totalmente com as práticas violentas do sistema de tortura duvalierista.

Foi a partir deste instante que começamos a assistir uma proliferação e multiplicação de pequenos grupos armados nos subúrbios do sul (Martissant, Fontamara), sudeste (Bel Air), norte (Cité Soleil) e nordeste (Simon Pelé, Delmas 2). Excepcionalmente, em Cité Soleil, falava-se de «Exército Vermelho» como organização criminosa e terrorista. Entre 1990 e 1994, animosidades, ódios, frustrações, inimizades, conflitos intergrupos, insatisfações sociais acumuladas, violências coletivas entre os jovens numa sociedade fraturada aumentaram consideravelmente barreiraram os avanços sociais. O retorno de Aristide em 1994 era muito solicitado nos bairros populares na esperança de mudar alguma coisa e significava para os moradores dessas localidades não somente uma vitória à resistência, mas, sobretudo, uma mudança das condições sociais e econômicas. Nada disso ocorreu. As decepções do povo aumentaram cada dia e assim a comunidade de Cité Soleil estava caminhando para a politização dos conflitos.

2.3.Terceira Geração 1994-2003: O início da politização dos conflitos armados e das violências coletivas em Cité Soleil

Aquele famoso «Exército Vermelho» que, aparentemente, teria nascido nas lutas sociais e políticas pelo retorno de um governo constitucional e legítimo no qual se insere a continuação e a terminação do mandato presidencial de Aristide interrompido em 1991, se ampliou e se tornou um instrumento político eficaz nas mãos dos atores políticos que vão aproveitar da sua existência para politizar melhor os conflitos e as violências ao invés de resolvê-los. Este retorno não significava o fim desta organização. Ao contrário sua politização criou uma estrutura mais oculta: as Organizações Populares (OP) constituídas majoritariamente dos partidários do partido Fanmi Lavalas. Nesta geração diversos fenômenos aconteceram, mas o surgimento das Organizações Populares era o mais importante porque ao longo do segundo mandato de Aristide as OP – uma espécie de estruturas embrionárias dos grupos armados – se opuseram à uma parte da sociedade política, em particular, ao setor da oposição. Nos distritos populosos e contaminados pelo movimento Lavalas, as OP eram o braço direito do regime.

Elas começaram a ser perigosas e embaraçosas pelo próprio regime que não tinha a capacidade de desmobilizá-las nem a capacidade de controlá-las porque elas se tornaram cada vez mais descontroladas e indomáveis. Por conseguinte, elas provocaram uma situação de instabilidade política tanto pelas suas ações violentas contra os oponentes do regime quanto por sua insatisfação expressada nas manifestações populares marcadas pela violência. O regime Lavalas começou a se torna desconfiável e contestável. Elas começaram a se desconfiar nele, mas sem romper as relações com ele. O que ia criar uma degenerescência social progressiva dos conflitos até a demissão forçada do presidente Aristide em 2004. O município entrou assim numa fase mais intensificada de violências coletivas e de conflitos armados. O nome dado a este momento histórico era Operação Bagdá de 2004 a 2007, que pode ser chamada também a grande tribulação de Cité Soleil.

A administração de Préval no âmbito do primeiro mandato (1996 a 2000) era praticamente paralisada e aparentemente pacifista. Porque, de um lado, ele era um personagem da visibilidade política, no entanto, quem estava realmente no comando era seu mentor político, Aristide. Na teoria, ele tem o mandato constitucional e legítimo do povo, porém, na prática quem comanda é o outro. Sem autonomia de governança, o presidente que chegou ao poder em fevereiro de 1996 era uma espécie de marionete nas mãos dos burocratas do regime Lavalas. Ele dirigiu o país respeitando o princípio de gratidão por dever tudo a este partido político do qual se afastou totalmente no segundo mandato em 2006. Cité Soleil, neste período, era aparentemente pacificada, mas na verdade era como uma região muito esquecida do país. Para ele, o mais importante é assegurar o segundo mandato de Aristide em 2001, então a responsabilidade principal de Préval era manter as zonas violentas e conflituosas numa pacificação aparente, porque no fim dos anos 1994, as violências coletivas e os conflitos armados nos bairros populares tendiam a aumentar. Em resumo, o jogo político consiste em projetar uma aparência de democracia e abertura do regime. Mas, tudo isso se inscreveu num conservadorismo do poder pelo partido Lavalas. É por isso que durante esse quinquenal, o país conheceu os momentos de imobilismo social, econômico e político mais tristes aos quais se acrescentou o aumento da insegurança até as eleições de 2000.

Na verdade, era uma falsa pacificação das violências coletivas e dos conflitos armados nos bairros populares particularmente em Cité Soleil. Com efeito, a chegada do novo milenário foi fortemente transtornada em Cité Soleil pelos conflitos que opuseram as localidades como Boston e Rail fazendo dois mortos, seis feridos e 4 casas incendidas segundo as noticias de Metropole, uma mídia nacional, em 28 de dezembro de 2000. Entre 1995 e 2000, uma centena de pessoas foi assassinada em Cité Soleil por balas e armas brancas. Em 2001, apesar das contestações da oposição contra as eleições fraudulentas de 2000, o mundo assistiu a prestação de posse do novo presidente da república que chegou ao poder num clima politicamente complicado e socialmente incerto. Em Cité Soleil, as OP se mostravam ainda mais arrogantes e intolerantes a respeito das pessoas de afiliação política diferente.

A situação social e política piorou sem nenhuma disposição política de resolvê-la e sem um ato de denúncia dos atos de violência e de intolerância das OP contra os membros da oposição. Com efeito, entre 2002 et 2003[4], os membros da oposição democrática eram os principais alvos desta intolerância popular. As intervenções do governo eram uma forma de justificação das ações das organizações populares que se confundiam muito com os grupos armados, porque os principais chefes civis que faziam parte delas eram sujeitos armados. a oposição de fortaleceu e ganhou uma boa parte da população que se sentia profundamente decepcionada, porque até lá não havia nenhuma mudança esperada na sua vida social e econômica. Começaram então as manifestações populares em paralelo às organizadas pela oposição contra o governo Lavalas. Num jornal famoso da capital lemos o seguinte:

Les habitants de Cité Soleil sont au bord de la colère face à la dégradation de leurs conditions de vies. Ils menacent de lancer une série de manifestations hostiles au gouvernement (...) Des jeunes, des adultes du plus grand bidonville de Port-au-Prin menacent de se mobiliser contre le pouvoir Lavalas. Prise de conscience, déception, frustration, de petits groupes de résidentes de Cité Soleil grondent. À l´origine de cette grogne, le comportement du régime qui, selon eux, ne se soucie guère de leur misère. Une misère qui augmente de jour en jour dans l´indifférence totale des autres décideurs, font-ils remarquer. Dans le plus grand bidonville de Port-au-Prince, le vent de la désolation souffle sur les maisonnettes et met à nu toute la souffrance de cette population: ces jeunes qui ne peuvent pas aller à l´école, ces adultes qui périssent dans le chômage, ces personnes agées anadonnées à elles-mêmes et enfin ces enfants qui crèvent de faim[5] (Metropole, de 24 de outubro de 2001).

As OP eram formadas por maioria de jovens entre 15 e 25 anos oriundos dos bairros pobres como Cité Soleil, Fort Mercredi, Martissant, Bel Air, Solino, La Saline, e por aquelas chamadas no Haiti, crianças de ruas de acerca 10 a 12 anos. E, como o governo nunca se posicionou ou se afastou claramente das violências cometidas pelas OP, que sempre foram consideradas como um instrumento político do governo para reprimir todo tipo de oposição, então ele foi severamente criticado por isso e se colocou pessoalmente numa situação política muito inconfortável. Já estamos numa fase muito avançada da utilização e da instrumentalização política dos grupos armados pelo setor político dentro do poder e fora do poder, e isso ia à degenerescência total. Porque esses grupos paramilitares que teriam alguma relação com o governo se tornam descontroladas para este mesmo governo. Sem que os problemas sociais e econômicos anteriores nunca sejam aprimorados em Cité Soleil, a partir dos anos 2003 entramos na etapa mais exagerada e perigosa da politização sistemática dos conflitos armados e das violências coletivas em Cité Soleil e em La Saline que, na época, eram consideradas como o bastião das OP. A instrumentalização dos grupos desfavorecidos a fins políticos incitando-os à violência, aos conflitos internos entre eles mesmos criou uma instabilidade política monstruosa no país até o acontecimento daquela Operação Bagdá em 2004 que anunciou, por conseguinte, a última geração pela qual Cité Soleil passou antes de chegar hoje a este momento de autopacificação e autoneutralização dos conflitos armados intergrupos.

2.4.Quarta geração 2004-2015: Operação Bagdá: Cité Soleil como centro da amplificação e extensão das violências coletivas e dos conflitos armados

Se olharmos um pouco para trás na história do Haiti, podemos constatar que o país se acostuma a começar seus novos séculos com eventos esquisitos que decepcionam sua relevância histórica mundial. Se o século XIX começou com o assassinato do líder principal da independência em 1806, Jean-Jacques Dessalines, no século XX o país ia conhecer a humilhante ocupação norte-americana em 1915. O século XXI que deveria comemorar o segundo centenário da nossa independência foi dolorosamente afetado por manifestações populares intensas sob as pressões das quais Sr. Aristide se demitiu e não somente surgiu aquela Operação Bagdá em 2004, mas também o país caiu sob a dominação de um exercito multinacional. Entendemos por Operação Bagdá o período de alta violência generalizada, entre 2004 a 2007, entre grupos armados e policias e caracterizado pelas confrontações violentas e conflitos intermitentes entre grupos armados nos bairros populares chamados zonas vermelhas. Era um dos momentos mais difícil na vida do povo haitiano no início do século XXI. Esta situação paralisou quase a totalidade das atividades sociais e econômicas e dividiu o país em dois blocos completamente incomunicáveis: Norte e sul. Cité Soleil no centro era não frequentável e inabitável.

Muitos elementos sinalizadores demonstravam que estávamos caminhando para esta degenerescência dentre os quais gostaríamos enfatizar alguns: armamento clandestino, invisível e cúmplice dos grupos em Cité Soleil, falso programa de desarmamento e de desmantelamento dos grupos armados e dos antigos membros do exército, proliferação das OP e sua superpotência, posição partidária do governo a respeito das OP, mistura e confusão entre OP e grupos armados, politização da polícia e fragilização das outras instituições estatais como, por exemplo, a justiça. Com efeito, em fevereiro de 2002, sob a direção do presidente o governo encontrou os chefes OP no palácio nacional (Metropole, 27 de fevereiro de 2002). Até hoje, ninguém sabe o que foi dito nesta reunião na qual participavam as OP de Cité Soleil. A questão é como um chefe de estado pode decidir encontrar indivíduos considerados pela polícia e pela justiça como bandidos? Após este encontro, nos dias seguintes, ocorreu o assassinato de uma policial que criticou esta iniciativa, o aumento constante das violências, a agravação das rivalidades intergrupos nos bairros populares inclusive Cité Soleil, um desrespeito absoluto dos membros OP para os policiais até que um deles muito influente tenha ameaçado um comissário de polícia pelo súplice da coleira. Em termos cronológicos, a Operação Bagdá começou nas vésperas de 2003 quando as confrontações violentas entre OP e grupos de estudantes se intensificaram. Este momento era chamado também Operation bouclier, uma forma de apartheid em todo sentido: 1. territorial entre zonas altas e zonas baixas, zonas burguesas e guetos; 2. social entre estudantes e quimeras; 3. político entre oposição e partidários do governo; enfim, 4. econômico entre ricos e pobres, entre empregadores e empregados. Era a época da grande apologia do ódio e da violência.

Desde as eleições de 2000 que marcaram a entrada na posse, em 2001, de uma nova administração, o país começou a ser muito agitado por, de um lado, diversas protestações contra o governo que vários setores da sociedade política consideravam como ilegítimo e imoral porque roubou as eleições, mas, do outro lado, pelas manifestações dos partidários do governo para apoiá-lo. A situação vai se tornar muito pior quando, em 2003, o grupo da oposição decidiu descontinuar todo tipo de discussão com o governo e entrou numa fase de radicalização da sua luta e chamou seus partidários e a população inteira à desobediência civil. Isso ocorreu após a oposição ter sido convencida claramente da não vontade do governo de dialogar e de resolver o problema das OP que, além de ter sido muito crucial e sério, era uma das principais condições da oposição para retomar as discussões com o governo, porque as OP se tornaram cada vez mais arrogantes, violentas e insuportáveis. Temos duas situações complicadíssimas. De um lado, as OP que, não sendo distintas das bandas armadas, não ajudavam seu próprio governo ao provocar tantas violências e confrontações e agressões contra os membros da oposição e a população civil. Suas ações violentas e intolerantes eram contrárias ao jogo democrático e enfraqueceram seu próprio governo. Do outro lado, não somente o governo nunca definiu uma posição de neutralidade, mas ele se mostrou também radical a respeito dos membros da oposição.

Neste contexto, o dialogo político se torna impossível. A crise agravou. Cada parte está afirmando sua intransigência e sua radicalidade. Enquanto, por outro lado, os estudantes e os sindicais entram na luta para reclamar a demissão rápida do presidente, pois, o tempo de negociação e de recomposição do governo acabou. Nesta fase de radicalização das diferentes partes, que podemos chamar situação de não retorno, as violências e os conflitos se intensificaram em Cité Soleil. Os chefes de bandas armadas se mataram entre si. Por exemplo, em março de 2005, um grupo armado saindo de Projet Drouillard atacou o de Boston. Esta confrontação terminou com a morte do chefe principal da banda armada em Boston que era do lado da oposição segundo as palavras do chefe de banda armada de Projet Drouillard. Eu me lembro desta cena de violência como se fosse ontem. Neste dia, a banda armada de Projet Drouillard comandada por um denominado Dread Wilme desfilou na frente da minha casa. Eu podia ouvir o chefe principal vociferando: “os grupos de Labanière vêm nos atacar e nos ripostamos atirando neles”. Era para se defender, pois, na verdade, foi ele e sua banda armada que foram atacar a daquele Labanière, o chefe de Boston na época. Labanière, um antigo chefe OP, se rebelou contra o regime Lavalas e se aderiu aos grupos da oposição. E, como Cité Soleil se declara feudo deste regime, então não pode existir oposição neste bairro. Voluntaria ou involuntariamente, direta ou indiretamente todo mundo é Lavalas lá. Cité Soleil, bastião do partido Lavalas, se tornou o santuário dos conflitos sociais e políticos.

De fato, a última geração das violências coletivas e dos conflitos armados em Cité Soleil se caracteriza pela articulação desses conflitos aos fatores políticos discriminatórios e partidaristas, ou seja, o procedimento do armamento clandestino por um sistema político dos grupos vulneráveis da população no objetivo de impedir aos oponentes puderem se manifestar contra ele. Sem dúvida, é  isso o terrorismo de Estado: uma exploração cruel das condições sociais precárias dos indivíduos por um regime sanguinário muito pouco preocupado a resolver os problemas sociais e econômicos que nunca foram aprimorados tampouco resolvidos. Esta situação de miséria, de pobreza e de vulnerabilidade se tornou uma fraqueza indispensável para os atores políticos poderem explorar mais facilmente os jovens.

O armamento acelerado e invisível dos grupos armados[6] criou uma situação de fortalecimento dos mesmos que, tendo consciência da sua influência e força, se deixaram manipulados a menos que tenham o que precisam, a saber, dinheiros, cheques zumbis, munições e comidas para seus soldados. São jovens entre 16 e 25 anos que são sistematicamente instrumentalizados para reproduzir a violência em prol daqueles grupos econômica e financeiramente fortes e poderosos que só podem resolver seus problemas pela violência. Na verdade, a mão política nunca estava ausente nos conflitos armados em Cité Soleil desde seu início, porém, ela nunca foi tão visível, clara, cruel e demonstrativa como no início dos anos 2000. Em 2004, a situação de conflitos armados e de violências coletivas atingiu um nível inacreditável de gravidade e de exageração em Cité Soleil. Esta última geração se caracteriza, por um lado, pela frequência e pela repetição das rivalidades sociais das bandas armadas entre si, e, por outro lado, pelo agravamento das confrontações entre essas bandas armadas e os policiais. A polícia – antes da chegada da Minustah em abril de 2004 – desempenhou, apesar dos seus números limitados e das suas capacidades materiais e técnicas insuficientes, um papel profissional como única força nacional de interposição entre os sujeitos armados e os civis. Às vezes, ela atua com brutalidade e arbitrário para fazer retornar a ordem. Com a chegada da Minustah, as intervenções brutais e violentas se multiplicavam.

Em resumo, os fatores explicativos das violências coletivas e dos conflitos armados em Cité Soleil são múltiplos e complexos e variam de acordo com o contexto socio-histórico considerado. Se, por exemplo, no início até a década de 1990, em Cité Soleil, eles eram exclusivamente ligados – sem risco de se enganar – às necessidades de ordem social e econômica, a partir dos anos 2000, eles são extremamente politizados sem, de modo algum, resolver as necessidades sociais sem soluções mais duradouras. Ao contrário, elas eram uma fraqueza muito explorada com maldade. A criação das OP é um dos eventos mais importantes na politização flagrante dos conflitos armados e das violências coletivas em Cité Soleil. Depois vem a Operação Bagdá. Do ponto de vista teórico, o governo começou a retomar o controle timidamente da capital e de algumas zonas populares afetadas por este evento a partir do fim de 2007. Algumas zonas vermelhas como Cité Soleil começaram a serem frequentáveis após várias intervenções da polícia e das forças onusianas. Porém, os conflitos armados e as violências coletivas em Cité Soleil não acabaram, mas se estenderam até o fim de 2015. Uma avaliação estatística das vítimas de todos os fenômenos que tomaram Cité Soleil como refém, em particular a Operação Bagdá, é muito difícil a fazer. Todavia, os traços ambientais e as sequelas sociais que eles deixaram num Cité Soleil ajoelhado são ainda muito visíveis.

3.      Balanço das gerações de violência e conflitos em Cité Soleil

Essas diferentes gerações de violências e de conflitos deixaram perdas humanas inumeráveis e insubstituíveis, danos materiais e ambientais irreparáveis ​​e incontáveis. De 1995 a 2000, a insegurança e a violência de todos os tipos custaram a vida à mais que 76 pessoas só em Cité Soleil (AVRIL, 2000, p. 329-361). O ano 2005 sozinho era responsável por mais de 77 pessoas assassinadas. O ano mais sangrento em Cité Soleil era 2012 quando acerca de 110 pessoas foram assassinadas por indivíduos armados (JILAP, 2005, 2012). Em 1993, um fogo devorador destruiu mais do que 1500 casas e chalés em Cité Soleil, deixando atrás milhares de famílias sem abrigo e centenas mortes. Em setembro de 2002, indivíduos armados que continuavam a semear a desolação na população massacraram acerca de 20 pessoas, feriram uma centena de outras e incendiaram cerca de 500 casas nas confrontações armadas (METROPOLE, 5 de setembro de 2002b).

Esta situação causou uma degradação monstruosa do meio ambiente de Cité Soleil e impediu a criação do trabalho, por exemplo, nos setores de limpeza dos canais para criar passagens das águas diluviais, de urbanização, de saneamento e de reflorestamento. Estes trabalhos poderiam gerir empregos mais ou menos permanentes, o que melhoraria consideravelmente a vida econômica de algumas famílias. Com um nível de vida econômica relativamente melhorada, o indivíduo poderia atender suas necessidades e as da sua família em matéria de saúde, educação, alimentos, roupas e outros. Mas, foi observada uma estagnação da pobreza acompanhada de um aumento constante das vítimas por armas de fogo. Entre julho e agosto de 2005, Cité Soleil registrou 120 mortes por balas contra 44 com armas brancas de todo tipo confundido (JILAP, 2005). Isso significa que as violências e os conflitos com armas de fogo estão em neto crescimento.

É evidente que, desde 2000, algumas coisas mudaram no que diz respeito à natureza dos conflitos armados e das violências coletivas em Cité Soleil, particularmente, a configuração sociológica dos grupos armados. Primeiro, os grupos são mais armados do que antes. Segundo, entre 2004 e 2006, eles estavam reproduzindo uma violência cega contra a população reduzindo sua mobilidade social e complicando sua vida econômica. Terceiro, as armas que eles têm na mão não são para brincar, mas para ganhar dinheiro cuidar de si mesmos e das suas famílias. Por fim, a entrada dos elementos políticos que vem suplantando os fatores sociais e econômicos anteriores, agita os debates em torno da complexidade do fenômeno. Conforme mostrado na tabela abaixo, com base nas estatísticas anuais sobre os atos de violência nas áreas metropolitanas e em Porto Príncipe da Comissão Episcopal para Justiça e Paz (JILAP), a violência armada matou muitas pessoas em Cité Soleil. Ao longo dos últimos 11 anos, mais do que 426 pessoas morreram em circunstâncias direta ou indiretamente relacionadas às violências e aos conflitos orquestrados por indivíduos armados. Em comparação ao resto do país, Cité Soleil tem um porcentual de mortalidade por balas de 66,56%. Uma situação extremamente alarmante.

Tabela de porcentual das vítimas por balas em Cité Soleil

Ano
Vítimas por balas dos indivíduos armados em Cité Soleil
Vítimas por balas dos indivíduos armados nas zonas metropolitanas
Porcentual
2005
34
77
44,15%
2006
3
6
50%
2007
5
30
16,66%
2008
11
30
36,36%
2009
11
18
61,11%
2010
71
104
68,26%
2011
50
59
84,74%
2012
87
110
79,09%
2013
68
92
73,91%
2014
18
26
69,23%
2015
35
44
79,54%
2016
33
44
75%
Total
426
640
66,56%

Fonte: Comissão Episcopal para Justiça e Paz (JILAP).

Considerações finais

A falta de educação, o problema de autoestima, a demissão das famílias, a falta de inteligência, estão à origem da manipulação e da exploração política desses jovens abandonados por suas famílias; expulsados dos bancos escolares; proibidos de entrar na faculdade ou num centro profissional; privados de lazer e de atividades culturais, esportivas e recreativas; vítimas de fobia de todos os tipos e em todos os lugares; desprezados e humilhados no mercado de trabalho devido às suas qualificações inadequadas; e, finalmente, enganados, violentados em sua moral por um sistema social corrupto. Assim, eles se tornam uma presa muito fácil. Ao diagnosticar as situações de violências e conflitos urbanos em Cité Soleil, podemos resumir as quatro gerações em duas grandes fases interligadas. A primeira, vista como normal e legítima, corresponde exclusivamente à insatisfação dos problemas sociais e econômicos da comunidade desde a criação deste município. A segunda, criticada como anormal e anômica, era caracterizada pelo aumento cego e exagerado dos crimes entre 2004 e 2007. Os sujeitos armados são perfeitamente conscientes do potencial deste município, das vantagens de controlá-lo e da importância dos grupos armados que são um instrumento de criação de instabilidade e de insegurança quando os setores financeiros, políticos, comerciais e econômicos que os controlam são infelizes da política do regime governante. Esta força exterior que os controla é mais constrangedora e poderosa do que sua vontade de mudar de vida.

BIBLIOGRAFIA

ALPHONSE, Roberson. Week-end sanglant à Cité Soleil. Le Nouvelliste, Port-au-Prince. 19 oct. 2015. Disponible sur: http://www.lenouvelliste.com/article/151359/week-end-sanglant-a-cite-soleil. Dernier accès le 14 aou. 2017.
ANONYME. Arrestation de Alain Cadet, alias "Pinochet", numéro deux du gang de Belony. Radio Télé Kiskeya, Port-au-Prince. 5 avr. 2007. Disponible sur: www.radiokiskeya.com. Dernier accès le 15 aou. 2017. 
ANONYME. De nouvelles victimes de la violence à Cité Soleil. Radio Télé Métropole, Port-au-Prince. 19 nov. 2002. Disponible sur: www.metropolehaiti.com. Dernier accès le 29 aou. 2017.
ANONYME. Cité Soleil à nouveau frappé par des violences qui ont faits 20 morts ces dernières semaines. Radio Télé Métropole, Port-au-Prince. 5 sep. 2002. Disponible sur: www.metropolehaiti.com. Dernier accès le 29 aou. 2017.
ANONYME. Un journaliste canadien victime de l´insécurité à Cité Soleil. Radio Télé Métropole, Port-au-Prince. 22 jan. 2002. Disponible sur: www.metropolehaiti.com. Dernier accès 29 aou. 2017.
ANONYME. Haïti: Cité Soleil, le repaire des détenus évadés après le séisme. Le Nouvelliste, Port-au-Prince. 11 mar. 2010. Disponible sur: www.lenouvelliste.com. Dernier accès le  14 aou. 2017.
ANONYME. En Colombie, l´ex-guérilla des FARC lance son parti. Le Monde. 1 septembre 2017. Disponible sur www.lemonde.fr. Dernier accès le 1 sept. 2017.
AVRIL, Prosper. Vérités et révélations: L´armée d´Haïti, bourreau ou victime. Tome III. Port-au-Prince: Imprimerie le Natal S.A., 1997.
AVRIL, Prosper. Haïti (1995-2000): Livre noir de l´insécurité. Florida: Universal Publishers, 2004.
BODY-GENDROT, Sophie. Ville et violence: l´irruption de nouveaux acteurs. Paris: PUF, 1993.
COMMISSION NATIONALE ÉPISCOPALE JUSTICE ET PAIX. RAPPORT. Violence dans la zone métropolitaine de Port-au-Prince. Port-au-Prince, (rapport 2005, 2006, 2008, 2012, 2016).
CASTEL, Robert. L´insécurité sociale: Qu´est-ce qu´être protégé? Paris: Édition du Seuil et la République des idées, 2003.
CHARLES, Etzer. Le pouvoir politique en Haïti de 1957 à nos jours. Paris: Karthala, 1994.
DALVIUS, Gérard. Une armée pour la démocratie en Haïti. Port-au-Prince: Imprimerie le Natal, 1987.
DELINCE, Kerne. Quelle armée pour Haïti? Paris: Karthala, 1994.
DIEDERICH, Phillippe. Fort-dimanche: La monstrueuse machine à tuer de la dictature des Duvalier. Port-au-Prince: [s.n.], 2014.
DIEDERICH, Bernard. Le prix du sang: La résistance du peuple haïtien à la tyrannie. Tome 1 François Duvalier (1957-1971). Port-au-Prince: Henri Deschamps, 2005.
DRAÏ, Raphaël; MATTÉI, Jean-François (Org.). La République brulle-t-elle?: Essai sur les violences urbaines françaises. Paris: Michalon, 2006.
ENGELS, Friederich. Théorie de la violence. Paris: Union Générale d´Éditions, 1972.
FABIEN, Jean. L´armée rouge: la marche vers une dégénérescence sociale des conflits armés à Cité Soleil? Blog Jean Fabien. 31 jul. 2017. Disponible sur: www.jeandefabien1426.blogspot.com.br. Dernier accès le 31 jui. 2017.
FANON, Frantz. Les damnés de la terre. Paris: La Découverte, 1961.
GUIMARÃES, Passos Alberto. As classes perigosas: Banditismo urbano e rural. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2008.
HOPQUIN, Benoît. La guerre de l´eau à Cité Soleil. Le Monde, Paris, 15 jun. 2007. Disponible sur: <http://www.lemonde.fr/ameriques/article/2007/06/15/haiti-guerre-de-l-eau-a-cite-soleil_923953_3222.html?xtmc=cite_soleil&xtcr=5>. Dernier accès le 30 jul. 2017.
JARAMILLO, Ana Maria. La fuerza de la razón sobre las armas: resistência civil no violenta y participación ciudadana en el Oriente Antioqueño, Colombia (2001-2004). Buenos Aires: Clasco, 2010.
KARL, Marx; ENGELS, Friederich. Violence et constitution des États européens modernes. Paris: Éditions de l´Herne, 1970.
LETH, Asger. Ghosts of Cité Soleil. Disponible sur: https://www.youtube.com/watch?v=_-D0dItn0Qc. Dernier accès le 4 sep. 2017.
MICKIEWICZ, Juliette; YOHAN, Blavignat. Nouvelle attaque terroriste au sud de Barcelone: cinq assaillants abattus. Le Figaro, Paris. 17 out. 2017. Disponible sur: www.lefigaro.fr. Dernier accès le 17 out. 2017.
MUGGAH, Robert. Haïti: Les chemins de la transition: Étude de l´insécurité humaine et des perspectives de désarmement, de mobilisation et de réintégration. Small Arms Survey, Institut Universitaire de Hautes Études Internationales. Génève: Imprimerie Coprint, 2005.
PÉAN, Leslie J-R. Haïti, économie politique de la corruptions: L´ensauvagement macoute et ses conséquences. Paris: Maisonneuve et Larose, 2007.
RÉSEAU NATIONAL DE DÉFENSE DES DROITS HUMAINS. Rapport sur les événements survenus à Cité Soleil le 16 octobre 2015. Port-au-Prince, 2016. 17 p. (Rap /A15/No09).
ROCHÉ, Sebastian. Sociologie de politique de l´insécurité: Violences urbaines, inégalités et globalisation. Paris: PUF, 2004.
ROCHÉ, Sebastian. Le sentiment d´insécurité. Paris: PUF, 1993.
SHARP, Gene. Existem alternativas realistas e mecanismos de luta não violenta. Curitiba: Atuação, 2015.
TOURAINE, Alain. Les mouvements sociaux d´aujourd´hui: acteurs et analystes. Paris: Éditions Ouvrières, 1982.
TROUILLOT, Michel-Rolph. Les racines historiques de l´État duvalíerien. Port-au-Prince: Henri Deschamps, 1986.

______. Le mouvement de mai ou le communisme utopique. Paris: Du Seuil, 1968.
WEBER, Max. Économie et société. Paris: Plon, 1971.
WORLD BANK. Haiti - Urban Community Driven Development Project / PRODEPUR. New York, 2008. Disponible sur: www.worldbank.com. Dernier accès le 15 out. 2017.



[1] Desde o processo de paz encontrado entre os diferentes centros de conflitos e de violências em Cité Soleil, a configuração social e política mudou praticamente. Doravante, a cidade é controlada por três grandes polos de bandas armadas. O primeiro tem seu feudo em Soleil 19, o segundo em Boston e o terceiro em Bélécou. Si o primeiro controla todos os distritos de Baixo-Soleil e o segundo os de Alto-Soleil, o terceiro, mais hostil às condições que engendraram esta paz tem uma atitude isolada por isso não controla nenhum distrito. Cabe compreender, além disso, que cada um desses distritos é dirigido por um sujeito armado satélite.
[2] Sobre este assunto ver HOPQUIN, Benoît. La guerre de l´eau à Cité Soleil. Le Monde, Paris, 15 jun. 2007. Disponible sur: <http://www.lemonde.fr/ameriques/article/2007/06/15/haiti-guerre-de-l-eau-a-cite-soleil_923953_3222.html?xtmc=cite_soleil&xtcr=5>. Accès le 30 jul. 2017.
[3] O exército haitiano, como demonstraram tão brilhante e objetivamente, vários autores notadamente Prosper Avril (1997), Kern Délince (1994), Michel Rolph Trouillot (1986) et Gérard Dalvius (1987), sobretudo na sua versão pós-ocupacional norte-americana, é uma instituição criada para açamar e reprimir o povo. Portanto, na origem ela é anti-povo e anti-nação, e, entre ela e o povo a relação se dá sempre muito mal, mesmo se do ponto de vista histórico e social os dois são inseparáveis.
[4] No dia 12 de julho de 2003, uma delegação da caravana de esperança do Grupo 184 veiculando um novo contrato social foi violentamente atacada com golpes de pedras, pelos partidários do governo ocasionando quarenta feridos dentre os quais alguns jornalistas (nossa tradução) (METROPOLE, 29 de agosto de 2003).
[5] Os habitantes de Cité Soleil estão à beira da raiva diante da deterioração de suas condições de vida. Eles ameaçam lançar uma série de manifestações hostis ao governo (...) Jovens e adultos da maior favela de Porto Príncipe estão querendo se mobilizar contra o regime Lavalas. Consciência, decepção, frustração, pequenos grupos dos residentes de Cité Soleil ressoam. Em consonância com este resmungo, o comportamento do regime que, segundo eles, não se preocupa da sua miséria. Uma miséria que aumenta diariamente com a total indiferença dos outros tomadores de decisão, ressaltam eles. Na maior favela de Porto Príncipe, o vento da desolação sopra sobre as casas e expõe todo o sofrimento desta população: esses jovens que não podem ir à escola, esses adultos que perecem no desemprego, essas pessoas idosas abandonadas a elas mesmas, e, finalmente, aquelas crianças que estão morrendo de fome (nossa tradução).
[6] O processo do armamento dos grupos armados em Cité Soleil permanece misterioso. E, mesmo se não disponhamos alguns índices, eles são, no entanto, insuficientes e menos convencedores para explicá-lo com tanta objetividade quanto isso exige.

mercredi 28 février 2018

LE SILENCE DU CRIME ET LE CRIME SILENCIEUX: L´AFFAIRE DU SCANDALE SEXUEL D´OXFAM EN HAITI

Résumé

Tout le monde sait que le crime est mauvais et que la société le condamne avec la plus grande rigueur. Il se retrouve, juste après l´infraction et le délit, au troisième rang des classes d´actes repréhensibles dont l´individu se rend coupable et que la loi punit. Il est donc passible des peines de privation de liberté allant jusu´à la peine de mort en passant par la perte des droits civils et politiques tout dépend de la société dans laquelle il a été perpétré et de la législation en vigueur. Néanmoins, le pir demeure le silence qui plane sur le crime par une quelconque preuve de faiblesse ou de complicité d´une instance étatique ou de la société. C´est évident que le silence du crime ou le crime silencieux promeuvent l´impunité et l´injustice sociale. Le scandale sexuel qui a frappé l´organisation humanitaire britanique Oxfam ces dernières semaines en Haiti en est un exemple frappant. C´est autour de lui que nous allons articuler nos réflexions à partir de ces deux notions.

Le silence du crime et le crime silencieux, c´est quoi?

Le silence du crime et le crime silencieux n´ont pas le même sens ni la même connotation, donc une différence de taille les distingue. En effet, ce qu´on pourrait appeler crime silencieux, c´est-à-dire le crime qui ne se parle pas, ne se communique pas, ne se divulgue pas, mais se confine dans les coulisses, est un crime parfait parce qu´il s´exécute à l´insu de témoins oculaires, alors que le silence du crime désigne le crime sur lequel on se tait ou qu´on force à taire. Bien qu´on ne sache pas encore si, d´un point de vue théorique, les deux termes existent, le silence du crime est un acte immoral, antisocial et condamnable qui n´a jamais été dénoncé ni dévoilé ni condamné même s´il se sait de tout le monde: du plus commun des mortel aux autorités compétentes en passant par les familles et les cercles amicaux. Le crime silencieux est donc discrétionnaire et enveloppé dans le plus parfait secret. En fait, ce dernier est, jusqu´à preuve du contraire, le plus dangereux pour la société. La connaissance d´un crime se circule entre les pairs avant d´être partagée au milieu de la communauté et des familles pour enfin aboutir aux oreilles des autorités compétentes. Or, le crime silencieux fait fi de tout cela.

Si le silence du crime est contre la morale et l´éthique, le crime silencieux est une stratégie pour obstruer la vérité. Elle ne s´obtient que par des couvertures, des compromis ou encore des complicités à tous les niveaux. Quand des autotités hautement placées choisissent de se taire sur un crime, cela rentre dans leurs intérêts et préfigure une société corrompue et pathologique. En outre, le crime silencieux tue et détruit à petit feu et a besoin de projeter aux yeux de tout le monde une image de bienfaiteur, d´humaniste, d´ange compassionnel. C´est dans ces angles (silence du crime et crime silencieux) qu´Oxfam se la coulait douce sans la moindre inquiétude. Silence du crime parce que, bien mise à nu, cette situation perdurait dans le pays sous les yeux complices des autorités haitiennes depuis plus de cinq ans. Crime silencieux car elle pratiquait ses orgies sexuelles sous le couvert de mission humanitaire sans se gêner. Heureusement, le mensonge aura beau parcourir mille ans mais la vérité le rattrape toujours en un seul jour. Et, si l´on comptait sur les autorités haitiennes, cette affaire resterait confinée dans le silence le plus complice de l´État comme c´était le cas pour la Minustah sur le dossier de choléra sur lequel on reviendra succintement.

Il est quand même désolant que les autorités haitiennes ou les institutions influentes de la société civile n´aient pas été les premières à dénoncer ces crimes silencieux d´Oxfam. Encore pir que le gouvernement haitien admette n´avoir reçu aucun rapport, aucune alerte, aucun signal sur les malversations de cette ONG. Or, la loi exige le MPCE d´avoir un regard sur le fonctionnement des ONGs en Haiti. Il lui est fait obligation de controler strictement par des inspections régulières les activités des ONGs nationales et internationale qui doivent, en retour, lui soumettre leur plan d´action, leurs activités, leur rapport financier en vue soit d´une prorrogation de leur permis de fonctionnement ou de son retrait. Cela reste dans la théorie, mais dans la pratique, en fait, les ONGs ne rendent guère des comptes au MPCE qui se montre souvent laxiste envers elles. D´ailleurs, issues le plus souvent de superpuissances, elles se croient elles-mêmes toutes-puissantes et prétendent n´avoir de compte à rendre à personne. Voilà pourquoi l´Oxfam se complaisait dans ce crime silencieux.

L´affaire Oxfam lève la voile des missions humanitaires déshumanisantes dans les pays pauvres

Oxfam est une organisation d´aide humanitaire fondée en 1942 en Engleterre après la Seconde Guerre mondiale. Ces premières actions humanitaires ont été d´abord l´envoi de rations alimentaires aux femmes et enfants affectés par cette guerre. Au fil du temps, elle étend son champ d´actions notamment dans le domaine d´aide au développement, de justice social et de lutte contre l´inégalité sociale et la pauvreté. Présente dans 94 pays et formant une confédération d´environ 20 organisations non gouvernementales, Oxfam est arrivée en Haiti sous la dictature duvaliérienne en 1978. Elle y gagne prestige, confiance et respect. 

Le tremblement de terre de 2010 lui a, peut-on dire, donné une plus grande visibilité sur la scène nationale dans la mesure où ses interventions dans la distribution des aides humanitaires aux victimes se faisaient beaucoup plus remarquer. Après, elle a choisi parallèlement de concentrer ses programmes sur la reconstruction et la croissance dans les milieux urbains tout en remplaçant les aides alimentaires par celles au développement. C´est dans ce contexte de détresse et de désolation du peuple haitien que s´éclate le scandale sexuel dans lequel Oxfam est épinglée. Les rapports accablant l´organisation soutiennent qu´elle aurait, en échange de ses aides humanitaires, contracté le service de jeunes prostituées pour pratiquer des orgies sexuelles. Ce faisant, l´ONG est accusée de pratique de prostitution et se fait passer pour la pire des sadiques et inhumaines organisations d´aides humanitaires que le pays n´ait jamais connues.

Sur ce, le dossier à scandale sexuel d´Oxfam offre désormais l´occasion de relancer le débat sur la vraie place des missions humanitaires pas seulement en Haiti, mais dans les pays pauvres. Par ailleurs, il remet en question le concept d´autorité de l´État en ce sens qu´on se demande s´il est applicable aux États pauvres, faibles, paresseux et fainéants comme le nôtre. Cette affaire qui, sans nul doute, n´est pas la première et ne sera non plus la dernière, prouve réellement qu´en Haiti rien n´est sous controle. L´espace est libre et les individus qui y circulent et s´y meuvent sont livrés à eux-mêmes.

Le scandale sexuel qui affecte Oxfam aujourd´hui doit être aussi non seulement une occasion d´allumer les projecteurs sur les autres ONGs, mais surtout il doit banir toute naiveté ou tout esprit de confiance aveugle chez les dirigeants haitiens dans des entités organisationnelles qui se cachent derrière les actions humanitaires, les aides alimentaires ou la bienfaisance pour régler en catimini leurs petites affaires. Et, de fait, depuis ce dossier, d´autres ONGs qui oeuvrent dans l´humanitaire telles que La Croix-Rouge, Médecins Sans Frontières, Save the children, International Rescue Committee sont elles aussi concernées par des scandales sexuels. On considère donc que le cas d´Oxfam est l´arbre qui cache la forêt ou encore la partie visible de l´iceberg.

Par ailleurs, si l´affaire Oxfam prouve une fois de plus la paresse de l´État haitien, elle soulève une autre discussion de fond celle d´une presse d´investigation presqu´absente en Haiti. Ou si elle existe, son champ d´action reste extrêmement limité. En effet, l´une des faiblesses du milieu médiatique haitien qui a fait des efforts et des avancées considérables est celle du journalisme d´investigation. La presse haitienne a encore beaucoup de difficulté à se doter de journalistes d´investigation indépendants et compétents. De ce fait, l´affaire Oxfam doit être pour elle plus que jamais une opportunité de se renforcer et d e se consacrer à mettre sur pied des cellules exclusivement dédiées à des enquêtes d´investigations et capables de les mener en toute indépendance, liberté et impartialité.  Toutefois, je me demande également comment se fait-il que des organisations de défense des droits humains comme le RNDDH ou le POHDH n´ont pas eu le flaire de ces actes abjectes afin d´en alerter la société? Où étaient-elles passées durant ces huit ans? Sur ce, mise à part l´État haitien, les entités faisant partie de la société civile ont une grande part de responsabilité dans cette affaire.

Un silence du crime qui s´est déjà affirmé dans le dossier du choléra

Cette affaire Oxfam nous laisse l´impression de la monstruosité des missions humanitaires à visage d´ange, elles sont aussi bouleversantes que les crises politiques, les désastres naturels et les phénomènes humains réunis. En effet, la mission humanitaire de l´ONU, la Minustah, arrivée en Haiti en 2004, en plus des viols, des grossesses non reconnues et des enfants sans pères qu´elle nous a légués comme héritage, a filé au peuple haitien une des plus sales maladies, le choléra, qui a frappé des milliers de personnes et en a tué des centaines. L´État haitien a tout fait pour passer sous silence ce crime. Au siège des Nations-unies, le représentant haitien n´a pu une seule fois prendre la défense du peuple haitien en pointant du droit la Minustah comme principale responsable de la propagation de cette maladie.

De plus, sur les tribunes des Nations-unies, les présidents qui se sont récemment succedé, de René Préval à Michel Martelly, n´ont jamais eu le courage de reconnaîtrre la culpabilité de la Minustah, ce, malgré les rapports d´experts scientifiques selon lesquels le choléra a bel et bien été produit par un contingent népalais de la Minustah. Ce cas en ayant bouleversé le début du XXIème siècle haitien demeure le prototype du silence du crime. Or, n´était-ce les actions infatigables d´un infime noyau des défenseurs de droits humains mené Me. Mario Joseph, jamais le conseil de l´ONU n´aurait une attitude plus ou moins honnête en acceptant d´accompagner les victimes même si elle n´a jamais reconnu explicitement la responsabilité de la Minustah ni présenté ses excuses au peuple haitien. Ainsi, l´ONU qui ne se lasse de faire la promotion de la morale, de l´éthique et du respect de la dignité des peuples a elle-même violé ses propres principes. Car, la morale humaine veut que l´on s´excuse d´une faute commise à autrui.

Pas d´excuses, pas de réparation pour les victimes du choléra, mais cela fait plus de dix ans que le peuple haitien traîne derrière lui les conséquences de cette sale maladie qui est loin de se déraciner.  Oxfam est pas dupe, elle se rejouissait des orgies sexuelles profitant de ce cas de figure. Et le pir, c´est que tout ceci s´est déroulé dans l´enceinte de la résidence privée du représentant de cette organisation. Quelle honte! En fait, ce scandale laisse présager qu´il peut y en avoir d´autres du même genre étant étouffés continuent sous silence. Toutefois, une chose est certaine, c´est que l´affaire Oxfam est plus que jamais intéressante dans la mesure où elle nous doit interpeler sur la conduite déloyale des ONGs en Haiti et sur leur vrai rôle dans la société haitienne. Loin delà l´idée de mettre toutes les organisations humanitaires dans ce seul et même panier de saleté humaine dont Oxfam représente aujourd´hui l´une des figures de proue. S´il est dit que la confiance n´exclut pas le contrôle, en Haiti la confiance remplace le contrôle à tel enseigne qu´on a tendance à fermer les yeux sur tout ce qui se passe. Car, à entendre le ministre de la planification et de la coopération externe, pendant huits ans l´état haitien n´a jamais rien su de ce que manigançait Oxfam sur le sol national.

À qui le blame en premier?

Si tout cela est arrivé, la première entité à blamer c´est l´État haitien lui-même qui, pour une inième fois, s´est très mal comporté, car, non seulement ce cas est l´un des plus fréquents en Haiti depuis, dirait-on, les années 80, mais encore son attitude paraît suspecte. En effet, on ne sait et on ne saura jamais le nombre de jeunes filles à Cité Soleil ou à La Saline enceintées par des prêtres catholiques sous couvert d´aides humanitaires. Combien de femmes ont été contraintes d´avoir des relations sexuelles avec eux dans le but de faire admettre leurs enfants dans leurs écoles? Cela arrivait même pour un petit sachet de lait sinistré. Quand elles refusaient d´avorter, certaines sont abandonnées à elles-mêmes et d´autres contraintes au silence jusqu´à être menacées de mort. Donc, cela fait des lustres que nos jeunes filles se prostituent pour de l´aide alimentaire. Des personnes dont on aurait jamais imaginé font partie de ce réseau criminel de prostitution de luxe qui semble être une entreprise bien organisée. L´affaire Oxfam - comme celle de Weinstein à Hollywood - constitue la goutte d´eau qui vient renverser le vase des actes de viols, de prostitution, de harcèlements et d´abus sexuels  de tout genre qui empoisonnent l´avenir de nos jeunes filles.

Or si l´État haitien qui a la prérogative de garantir la sécurité de ces citoyens et concitoyens, a pendant longtemps fermé les yeux sur les actes d´exploitation sexuelle, c´est qu´il se fait complice de leurs auteurs (qu´ils soient des personnes physiques ou morales) sans vergogne. En fait, les autorités haitiennes ont, comme nous, été informées du scandale suite à la publication du rapport de The Times, un journal britanique. Le gouvernement paraît n´avoir aucun regret. Car il ne s´est pas excusé au peuple haitien en général, aux familles des jeunes filles exploitées en particulier de n´avoir pas informé la société à temps. De plus, il a, comme d´habitude, fui ses responsabilités face aux citoyens qui réclament vainement de lui protection et sécurité. Et, s´il s´avère être incapable de leur garantir ce minimum, ce n´est pas une raison qu´il continue à les livrer si secrètement et silencieusement. Le crime silencieux qu´Oxfam commetait durant 8 ans et dont elle est coupable aujourd´hui est à l´origine du silence criminel et de la pratique du silence du crime de l´État haitien contre son propre peuple. En outre, même s´il est dégueulasse et avilissant qu´une ONG ait profité de la faiblesse d´un État pour le fragiliser plus encore et exploiter ses membres dans la plus dégoutante et insultante indignité, cette affaire doit continuer de révolter la conscience sociale.

Endormis par la tristesse, l´Oxfam fait des ravages...

Tandis que des quotidiens britaniques en Europe, The Times, The Guardians etc. se mobilisaient sur des enquêtes depuis 2011 pour savoir ce qui se passe au sein de cette ONG, tout le monde en Haiti dormait: l´État, la société civile, l´opposition, les partis politiques, l´église, même les plus bavards e l´occurence les organismes de défense des droits humains. Pendant l´Oxfam fait des ravages avec nos jeunes filles, on se chamaillait. C´est bien dommage que ce soit une presse étrangère qui vienne nous ouvrir les yeux sur ce qui se passe dans notre propre maison. C´est une preuve que les services de renseignement ne fonctionnent pas. Si l´affaire Oxfam fait mal sur le plan moral, elle est pourtant une grande occasion de revoir nos services secrets s´il en existent encore quelques-uns et de fouetter la conscience collective pour qu´elle sursaute de son sommeil. Car, en dormant sans avoir un dispositif de sécurité en branle, c´est se livrer volontairement et même gratuitement à l´autre qui n´a pas besoin d´être forcément un ennemi. C´est gravissime qu´un État laisse son boulot de contrôle à une entité privée voire étrangère.

En fait, endormis par la tristesse et l´amertume qui les assaillent, Oxfam en profite pour faire des ravages sur le plan sexuel. Car, alors que les gens n´ont même pas encore fini d´enterrer leurs morts, de sécher leurs pleurs, de panser leurs blessures, pendant qu´ils creuvaient de faim dans les abris provisoires où ils trouvaient à peine une maigre ration alimentaire pour apaiser une faim cronique, pendant tout ce temps l´Oxfam, l´une des plus prestigieuses ONGs au monde, on peut le dire, profitait de la vulnérabilité de ces jeunes pour les exploiter sexuellement, ce dans le silence le plus parfait, c´est-à-dire sous le couvert de mission d´aide humanitaire. Quelle cruauté! Quel sadisme! mais surtout quelle inhumanité pour une organisation qui se dit humanitaire! L´Oxfam est une mission internationale financée à plus de 60% par la couronne britanique qui vient proposer ses aides humanitaires en échange de ce qu´on appelle la barbecue de la chair fraîche, ce dans l´irrespect total et absolu de la dignité de ces jeunes filles, du peuple haitien et de ses propres bailleurs. Elle n´est autre que le symbole manifeste de l´exploitation de la misère des gens. On apporte que des membres de cette ONG et d´autres exigeaient de nos jouvencelles des rapports sexuels non protégés en échange, par exemple, d´une bouteille d´eau ou d´un kit alimentaire.  Telle est la mission déshumanitaire que nous apportent ces missions humanitaires qui ne sont pas si ''catholiquement'' humaines qu´on le pense.

Il est difficile de connaître ce qui a bien poussé cette ONG, vieille de 40 ans en Haiti, à commettre de tels actes, de savoir pourquoi s´est-elle profitée du tremblement de terre qui a frappé le pays le 12 janvier 2010. On aimerait, toutefois, être imbus du nombre de temps qu´a duré cette pratique avant que l´ONG ne se fasse rattraper. On ne saura combien de jeunes filles en ont victimes avant que l´abcès ne s´éclate. Selon certains experts du fonctionnement des organisations non gouvernementales, cela n´a rien d´étonnant, car si les viols, les harcèlements et les abus sexuels sont monnaie courante dans les organisations humanitaires, la non dénonciation en constitue la face et le pile. Elle provient le plus souvent du chef. Quand celui-ci est lui-même impliqué dans ces malversations, il les étouffe,. Ou, quand, bien qu´au courant, il choisit de se fermer les yeux là-dessus surtout dans le cas d´une personne de confiance. Ce qui veut dire que c´est un réseau qui agit en toute complicité les uns au profit des autres.

Considérations finales

En dépit de tout et malgré cela n´aurait jamais dû se produire, il faut saluer quand bien même le fait que des hauts responsables de l´Oxfam ont su, même tardivement, reconnaître leur entière responsabilité dans cette affaire et présenté des excuses au peuple haitien. En ce sens, Oxfam s´est montrée un peu plus morale et consciente que l´ONU. Nous espérons qu´elle étáit sincère dans ses remords et a tiré les leçons nécessaires de ses terribles fautes afin de corriger ses erreurs. En second lieu, il faut saluer la décision des autorités haitiennes qui, bien qu´en retard ou par audace, ont pris des mesures pour interdire provisoirement la poursuite des activités de l´Oxfam sur tout le territoire national pendant deux mois. Ce delai est trop court à mon avis vue la gravité des gaffes qu´elle a commises. De plus, connaîssant la déliquescence et le laxisme dont font toujours montrent les institutions haitiennes, il y a lieu de s´inquiéter de l´honneteté et de la serieusité d´une telle décision et de se demander si on n´est pas entrain de jouer au théâtre ou si réellement le MPCE dispose de moyens et de temps pour mener ses propres enquêtes qui lui permettront d´aboutir à une décision finale menant soit à l´expulsion définitive de cette organisation sur le sol d´Haiti ou à sa reconduite telle quelle ou avec des modifications et sous certaines conditions. Enfin, troisièmement, il faut saluer le courage du journal britanique qui fut le premier à alerter le monde sur ce scandale. Cela montre un certain niveau de conscience, de moralité et d´éthique de ces sociétés plus développées qu´Haiti. Ainsi serait-il improbe de réduire l´affaire Oxfam à une immoralité de la Grande Bretagne ou de l´Europe.

Somme toute, en nous ouvrant grandement les yeux sur la face cachée des organisations non gouvernementales sur le terrain, l´affaire Oxfam nous offre la possibilité non seulement d´ouvrir des enquêtes plus générales sur toutes les ONGs afin de déceler s´il n´y en a pas d´autres mêlées à ce même scandale, mais surtout de repenser la politique de permis de fonctionnement qui leur est délivré en établissant de nouvelles règles beaucoup plus strictes et bureaucratiques, ce en les surveillant de plus près et en passant minutieusement en revue leurs rapports. C´est le moment ou jamais de cesser toute plaisanterie et complicité avec les ONGs, car nous avons une jeunesse à rendre justice.

Jean FABIEN

Campinas, 28 février 2018


dimanche 14 janvier 2018

PEUPLES NOIRS DU MONDE ENTIER INSULTÉS, INDIGNEZ-VOUS CONTRE VOUS-MÊMES ET NON CONTRE LES OBSCÉNITÉS DE L´AUTRE...

Résumé

Cet article a pour objectif de réfléchir sur les propos incenssés de celui qui occupe une fonction dignitaire – la plus haute de la première puissance militaire et politique au monde –, ainsi que sur les opportunités qu´ils pourraient inspirer aux nations noires choquées afin qu´ils puissent continuer à jouer leur vrai rôle dans un monde beaucoup plus humain, humaniste et humanisé.

Mots-clé: Insultes. Indignations. Conscience.

Abstract

This paper aims to reflect on the incensed remarks of one who occupies a dignitary position – the highest of the world's leading military and political power –, as well as on the opportunities they could inspire to shocked black nations so that they can continue to play their true role in a much more human, humanistic and humanized world.

Keywords: Insults. Indignation. Consciousness.

1.      Rappel des faits

Depuis le vendredi 12 janvier 2018, il est possible de lire dans les journaux américains, notamment  Miami Herald, et internationaux comme Le Figaro et Le Monde, sur les réseaux sociaux (facebook, twitter) des propos d´un président américain ne méritant pas ici, à mon humble avis, aucun qualificatif à force qu´ils réflètent les balivernités les plus rétrogrades de la société étatsunisienne tant sur le plan politique qu´historique et diplomatique. Ce dernier aurait déclaré en faisant allusion aux migrants africains, haitiens ou salvadorègnes: ''why are we having all these people from shithole countries come here? he asked according to The Washington Post. En des termes racistes et zénophobes ''shithole countries'' se traduit par ''pays de merde''. De l´avis de Ileana Ros-Lehtinen, une représentante du parti républicain, ces propos regrettables n´auraient même pas dû être prononcées dans une chambre fermée voire à la Maison Blanche. Quel peuple nègre de la terre, digne et fier de lui-même, ne se sentirait-il pas offensé par ces propos? Aucun. Absolument aucun. Et, de fait, les indignations surtout du côté des pays africains n´ont pas tardé à pleuvoir, dans les quatre coins du monde les consciences nègres s´en sentent révoltées. Du simple citoyen aux grands dignitaires, tous et toutes ont raison de dénoncer de tels comportements désaxés.

En tout cas, le fait même d´écrire là-dessus démontre non pas une certaine importance, mais traduit une certaine attention, et, l´on saurait passer sous silence de telles insultes ou les prendre avec légèreté. En outre, même si elles ne sont pas à la hauteur de ce que représentent les États-unis en tant que peuple, nation et puissance sur l´échiquier historique mondial, même si elles se réduisent uniquement à son personnage et à sa personne, rester indifférent vis-à-vis d´elles ce serait de la pure lâcheté et de la pire trahison. Toutefois, nos réflexions auront un caractère centriste pour analyser ces propos dans un juste milieu et comprendre ce qu´ils pourraient bien apprendre et apporter de positif à ceux et celles à qui ils ont été adressés.

2.      Ce que traduisent les obscénités trumpiennes

D´entre jeu, il convient de mettre à l´écart tout amalgamme en essayant de ne pas faire de ces propos ceux des groupes qui proclament le suprémacisme blanc aux États-Unis ou en Engleterre, et encore moins ceux de la race blanche en général même s´il y en a des similitudes. C´est tout à fait autre chose. De même, ils ne doivent, en aucune façon, concerner le peuple américain dans son ensemble. Bien heureusement, certaines personnes lucides et avisées ont rapidement pris leur distance par rapport à ces grossièretés. Donc, rien à voir. En revanche, ces propos ignobles ne devraient engager, j´en suis convaincu, que son auteur ainsi que son passé, son histoire, sa croyance, sa culture, sa formation, sa manière de penser, mais surtout sa santé mentale[1]. Ils sont l´image tout craché de l´homme atypique qu´il est. De toute façon, c´est le peuple américain si aimable, hospitalier, moral, croyant qui en souffre le plus et qui, de surcroît, est contraint de porter le fardeau des péchés mortels dûs aux absurdités et dérives d´un homme qui lui a été imposé par un système. Ce qui s´est passé à la Maison Blanche ce 12 janvier – si réellement de tels propos ont été tenus – n´est autre que l´ expression d´un homme en déséquilibre mental.

Cependant, je crois que les obscénités de ce monsieur dont je n´ose même pas citer le nom vu qu´il m´est totalement indifférent, dont quiconque aura lu cet article saura de qui il s´agit, ne doivent être ni trop valorisées ni trop banalisées, mais appréciées et comprises dans un juste milieu où les deux extrêmes, à savoir, noirs et blancs, ou encore migrants et autochtones, plus que jamais concernés, sont problématiques. Les peuples noirs auraient besoin de s´indigner contre eux-mêmes, de se rabattre sur eux-mêmes, de se faire eux-mêmes la morale d´avoir craché sur leur propre histoire en laissant aux pays occidentaux, notamment les Etats-Unis, corrompre leur cerveau, leur société, leur système, leur histoire, leur croyance, leur religion, leur culture, enfin, tout ce qui constitue leur structure sociale, politique, économique, symbolique et idéologique pour accoucher des dirigeants corrompus, dictateurs et facistes dans leurs intérêts exclusifs. Il faut surtout qu´ils comprennent que ce dernier vient de leur offrir une occasion en or pour se repenser. C´est le moment indispensable pour eux, non pas dans un esprit de suprémacisme noir en lieu et place du suprémacisme blanc, mais dans celui d´un amour humain, humaniste et fort - absent chez certains - de montrer qu´ils peuvent se transformer, se gouverner eux-mêmes et s´imposer sur la scène internationale.

Les peuples noirs ont une histoire qui a été et continue d´être saluée en maintes occasions avec grandeur, extraordinarité et considération par des intellectuels chevronnés du monde entier, de ce fait, ils ne sauraient être rabaissés, méprisés ou humiliés par les propos d´un débile, d´un incervellé ou d´un erratique dont le seul mobile se résume à l´argent et aux fortunes qu´il s´est construit en faisant fi de quelques valeurs humaines les plus élémentaires telles que le respect de l´autre, l´amour et l´humilité. Rien provenant de ce naziste désaxé ne devrait nous étonner. On sait que l´histoire unit les peuples en les aidant à mieux comprendre leur passé, à améliorer leur présent et à construire les uns à côté des autres un avenir meilleur, mais celui-ci vient pour les diviser et les soulever les uns contre les autres afin qu´ils se mutinent. C´est le piège dans lequel il ne faut surtout pas tomber, car tel est son but. Comme a dit un professeur dont le nom m´échappe, l´histoire est un présent constant, un éternel présent, un présent continu et répétitif qui se renouvelle. Lui, connaît-il cela? Voilà pourquoi ses propos sont en quelque sorte un affront à l´histoire des deux races humaines qui, bien qu´ils s´aiment et se haissent en même temps, ne peuvent ne pas vivre ensemble. Une ignorance du sens de l´histoire de la part de ce monsieur et du groupe suprémaciste blanc qu´il semble incarner, mais aussi un mépris de l´histoire de la part des peuples noirs qui, affaiblis et désunis, n´ont pas appris à mettre de l´ordre chez eux et à organiser leur politique migratoire, mais se sont soulevés les uns contre les autres sous la dictée de l´Occident.

Ce n´est pas le moment pour les peuples noirs de se mettre en colère, de se vouloir donner la mort, de s´en vouloir d´appartenir à la race noire, laquelle notion n´existe même pas d´ailleurs, ce à cause des stupidités de quelqu´un qui n´a aucune notion d´histoire. De plus, il est inutil d´opposer ici la fierté noire à l´imbécilité de cet homme, ce serait rendre un service démérité à ce dernier. Il s´agit plutôt, d´une part, pour tous les peuples de saisir l´occasion afin de mettre un peu d´ordre dans leur maison et de se dire en quoi ces propos pourraient-ils leur être une aubaine, un bien et un cadeau pour vivre autrement d´abord chez eux. Car, ce serait faire preuve de manque d´intelligence de croire que ces déclarations s´adressent uniquement aux noirs. C´est un signal et un message clair envoyé à tous les peuples de la terre qui continuent d´être fascinés par le rêve américain. En effet, je crois, contrairement aux autres, que de ces insultes il peut découler quelque chose de bien et de bon en ce sens que, dans un premier temps, les peuples noirs doivent comprendre qu´à travers ces déjantements les valeurs dont ils sont porteurs dans le monde: la liberté, la démocratie, les droits de l´homme, le respect de la dignité humaine, la souveraineté – kidnappées par les Occidentaux en pensant obstruer la mémoire – sont aujourd´hui gravement menacées, ce, non pas uniquement pour eux-mêmes, mais aussi pour chaque être humain indistinctement, et, dans un second temps, ils doivent commencer à se prendre en charge et à se respecter tout en créant un environnement vivable chez eux d´abord avant d´envisager de se rendre chez l´autre ou chez le voisin. 

Car, peu importe ce qu´on dit, ce provocateur aux tweets dérangeants sait parfaitement ce qu´il fait. Il faut comprendre que ses propos surviennent dans un contexte de phénomène migratoire international frappant principalement les pays africains en grande partie en fuite de la misère, la pauvreté, les persécutions politiques et religieuses, les catastrohpes naturelles, les difficultés économiques et j´en passe. Or, en dépit de tout, comme dit le proverbe haitien, ''chak mièl sensib pou siro yo'', tout peuple veut protéger son territoire, ainsi quelqu´un ne peut se prévaloir le droit d´y pénétrer n´importe comment et d´attendre d´être reçu sur des velours, il y a quand bien même un peu de pudeur et de dignité à faire valoir au départ comme à l´arrivée voire à la réception. Si je suis d´accord avec l´expression selon laquelle nous sommes tous des migrants ce n´est pas pour penser que cela confère, d´une part, le droit à quelqu´un d´arriver comme bon lui semble sur le territoire de l´autre, d´autre part, le devoir de ce dernier de l´accepter tel quel au mépris du respect de ses principes de droit et de politique. De plus, si la migration est humaine, donc régie par un principe d´humanité, ou, si immigrer est un droit reconnu à tout être humain, c´est aussi un droit qu´a chaque pays de définir comment celle-ci doit se faire dans le respect de la dignité et de la liberté de l´individu sans inciter la haine, la zénophobie et le racisme. Il ne faut pas se leurrer, dans la théorie on prône l´humanité dans les politiques migratoires tandis que dans la pratique c´est le principe de la souveraineté du pays d´accueil qui prévaut. C´est bien dommage que ce soit par des propos si haineux qu´un président d´une si grande nation a choisi de s´exprimer sur un dossier aussi pointu que la migration.

3.      Ce que les peuples noirs ont besoin d´apprendre des insultes trumpistes

Les peuples noirs auront beau en vouloir à l´administration américaine de ne rien faire pour arrêter ces hémoragies langagières de ce monsieur, le condamner pour être l´aile pure et dure de la suprématie blanche et de la haine des noirs, crier même s´il le faut, mais, s´ils ne se rendent pas compte combien leur étroitesse d´esprit, la défense de leurs intérêts mesquins et leurs démagogies ont été à l´origine de ces trivialités de la part de cet individu, même s´il est à la tête d´une nation puissante, les condamnations et les dénonciations n´auront presqu´aucun effet. Les nations noires révoltées par ces propos ont besoin de savoir que c´est l´heure qui est venue pour elles de se donner une autre image tant à l´intérieur qu´à l´extérieur sur le plan développementiste et migratoire. Au lieu d´afficher un comportement aussi déjanté que celui reproché à l´autre, et, parallèlement à l´idée de se fâcher, de se gueuler ou de se sentir envahis par l´esprit des leaders comme Desssalines ou Martin Luther, il leur vaudrait mieux de saisir l´opportunité pour s´analyser, s´évaluer, se comprendre, se redéfinir et s´unir pour lutter non pas seulement contre ce que les autres diraient ou penseraient d´eux, mais surtout contre leur propre manière d´immigrer. Je crains fort que les protestations suscitées par les excès de langage de ce monsieur ne se meurent en même temps qu´elles se sont fait entendre.

En effet, les peuples noirs insultés, en particulier les haitiens, ont plus que jamais besoin de se prendre au sérieux, car, certains propos peuvent être durs à entendre surtout quand celui qui les profère incarne une fonction publique et politique, mais la grande question est de savoir, au-delà de tout sentiment nationaliste ou d´humanisme camouflé et hypocrite, s´ils ne correspondent pas effectivement aux conditions de vie de ceux et celles à qui ils s´adressent? Ces dirigeants des pays concernés par ces insultations, qui expriment hypocritement leur indignation, n´y ont-ils pas eux-mêmes contribué en pillant leur pays, en exploitant leur propre peuple et en les chassant hors de leur propre terre natale? Les insultes peuvent être proférées soit à cause d´une arrogance, soit à cause d´une réalité dite de manière trop crue, mais quelque part elles cachent une certaine vérité. Personne ne peut étouffer la vérité. Il est plus facile de condamner l´autre pour ses expressions désobligeantes, insultantes, humiliantes ou choquantes que, après les avoir condamnées, de mettre de l´ordre dans son système et  dans son environnement. Et, de même, bien qu´il ne soit conféré à personne le droit d´insulter et de mépriser l´autre quels que soient son origine, sa culture, sa langue, sa famille, son pays, mais certaines insultes ne méritent pas seulement une réponse verbale, populiste et hypocrite, mais bien au-delà une réponse pragmatique, constante et pratique afin que les mêmes choses ne se répètent plus. En d´autres termes, après une insulte insupportable il ne sert absolument à rien de se sentir offenser si l´on n´est pas prêt de se corriger, de se redresser et de se renforcer.

Loin delà l´idée de blamer, mais il s´agit plutôt cette fois-ci d´un appel à une action pragmatique, réelle et concrète au lieu de pleurnicher, à une conscience de soi, à un regard autoreflexif sur soi au lieu d´écouter ou de s´enorgueillir de ce que les autres disent ou pensent. Il est humain de s´intéresser plus aux félicitations qu´aux insultes, cependant, si certaines félicitations renvoient parfois à une fausse conscience de soi, certaines humiliations peuvent être au contraire une opportunité de recouvrer sa vraie nature et de comprendre son véritable être. Cela ne veut, aucunement, dire qu´il faut toujours des insultes, des humiliations et des grivoiseries comme celles de ce monsieur pour fouetter son orgueil et avoir bonne conscience de soi. Par contre, c´est juste pour dire que quand une personne sait ce qu´elle est effectivement et ce qu´elle représente pour les autres, aucun propos de cette nature ne saurait l´ébranler voire l´affaiblir. Bien au contraire, les mépris serviront à la rendre beaucoup plus forte, ferme, confiante, rassurante que jamais. Les insultes n´ont eu et n´auront jamais raison de celui ou celle convaincu(e) de ce qu´il est, d´où il vient et où il va. Voilà pourquoi cet article était un appel aux peuples – mes compatriotes haitiens et mes frères africains particulièrement – qui se sentent offusqués par ces propos sans qualificatif pour leur dire que mis à part que c´est leur droit le plus entier d´exprimer leur colère contre ceux-ci, mais surtout pour leur supplier de saisir pour une inième fois – car cela fait des lustres que des migrants des pays pauvres issus de surcroît des nations noires sont persécutés, humiliés et discriminés – cette opportunité pour transformer ces insultes en occasion de s´organiser et de se développer pragmatiquement.

Considérations finales

Somme toute, il y a lieu de s´appitoyer sur le sort du peuple américain qui vit quotidiennement les dégringolades des valeurs démocratiques et humaines pour lesquelles il a courageusement combattu. Cette séquestration raciste et coloriste des États-unis d´Amérique aujourd´hui qui ont été, sont et resteront – qu´il le veuille ou pas – un pays d´immigration, une terre de migrants avec la force et le sang desquels ils sont si puissants et forts aujourd´hui, est la preuve de leur rétrogradation. L´histoire ne peut, en aucun cas, être responsable de l´ignorance, de l´idiotie et de la médiocrité de quelqu´un qui est entrain de couper les racines de l´arbre sur lequel il asseoit sa fortune. Sans migration on ne saurait parler de civilisation, de développement, de progrès, d´évolution et de révolution dans un aucun pays du monde. C´est une autre manière de dire que peu importe ce que disent et pensent les incervellés et pathétiques comme ce dernier, où qu´ils soient et à quels que groupes racistes et extrémistes qu´ils appartiennent, la migration restera une partie intégrale et intégrante de la personne humaine, vouloir la combattre c´est se rebeller contre l´humanité elle-même.

Références
DAWSEY, Josh. Trump deirdes protection for immigrants from ‘shithole countries’. The Washington Post. Washington, 12 janvier 2018. Disponible sur: www.washingtonpost.com. Dernier accès le 14 janvier 2018.
FRANCEINFO AVEC AFP. Donald Trump se demande pourquoi les immigrés aux États-Unis viennent de «pays de merde» comme Haïti. Franceinfo. Paris, 12 janvier 2018. Disponible sur: www.francetvinfo.fr. Dernier accès le 14 janvier 2018.
GAURON, Roland. Les États-Unis s´interrogent sur la santé mentale de Donald Trump. Le Figaro.fr. Paris, 13 janvier 2018. Disponible sur: www.lefigaro.fr. Dernier accès le 14 janvier 2018.
GÉLIE, Philippe. Donald Trump ne veut pas d´immigrés venant de «pays de merde». Le Figaro.fr. Paris, 12 janvier 2018. Disponible sur: www.lefigaro.fr. Dernier accès le 14 janvier 2018.
GUYONNET, Paul. Trump s´en prend aux immigrants en provenance de "pays de merde". Huffingtonpost France. Paris, 11 janvier 2018. Disponible sur: www.huffingtonpost.fr. Dernier accès le 14 janvier 2018.
LE MONDE. Trump traite Haïti et des nations africaines de «pays de merde». Le Monde.fr. Paris, 12 janvier 2018. Disponible sur: www.lemonde.fr. Dernier accès le 14 janvier 2018.
MADAN, O. Monique. Trump called Haiti a ‘shithole’ country – now South Florida lawmakers are not holding back. Miami Hérald. Miami, 11 janvier 2018. Disponible sur: www.miamiherald.com. Dernier accès le: 14 jan. 2018.
WATKINS, Eli, PHILLIP, Abby. Trump decries immigrants from ‘shithole countries’ coming to US. CNN. Washington, 12 janvier 2018. Disponible sur: www.cnn.com. Dernier accès le 14 janvier 2018.

Jean FABIEN

Campinas, 14 janvier 2018



[1] Depuis le début de ses escalades verbales et de ses propos agaçants par ses tweets émotifs et impulsifs sur des dossiers sensibles et brûlants, notamment celui de la Corré du nord, la presse américaine et celle du monde entier ne cesse de questionner l´état de la santé mentale du président. Le livre de Michael Wolff, The fire and Fury in the Trump White House vient d´enfoncer le clou (Le Figaro, 13 janvier 2018).