Resumo
O fenômeno de
conflitos armados e violências coletivas em Cité
Soleil – apesar de serem vividos e famosos – são objeto de poucos estudos.
As pessoas ignoram como ele começou. No entanto, todo fenômeno tem um início. É
este início que pode permitir compreendê-lo na sua complexidade e
integralidade. É para responder a esta necessidade que, a partir de vários momentos
de observações profanas acrescentadas recentemente às pesquisas sociológicas e
etnográficas, apresentamos aqui quatro momentos-chave suscetíveis de explicar
as trajetórias dos conflitos violentos em Cité
Soleil e entender por que eles se degeneram tanto. Esta tentativa objetiva provocar
uma reflexão crítica sobre a degenerescência social deste município.
Palavras-chave: Violência social. Conflito armado. Cité Soleil.
Abstract
The
phenomenon of armed conflicts and collective violence in Cité Soleil - despite being lived and famous - are the subject of
few studies. People ignore how it started. However, every phenomenon has a
beginning. It is this beginning that can allow you to understand it in its
complexity and completeness. It is to respond to this need that, from several
moments of profane observations recently added to the sociological and
ethnographic researches, we present here four key moments capable of explaining
the trajectories of the violent conflicts in Cité Soleil and to understand why they degenerate so much. This
attempt aims to provoke a critical reflection on the social degeneration of
this municipality.
Keywords: Social violence. Armed conflict. Cité Soleil.
Introdução
As violências
coletivas e os conflitos armados que paralisam Cité Soleil durante acerca de 30 anos permanecem ainda em estado
latente. Podemos reparti-los em várias gerações distintas por causa da
categoria social que neles se envolveu, ou ainda por causa da configuração
social dos grupos armados. Mas, escolhemos dividi-los em quatro momentos
históricos chaves. Esta divisão obedece a um critério socio-histórico porque –
como vamos ver mais adiante – a cada geração temos um tipo de conflito. O que
nunca mudou é as condições sociais e econômicas de vida dos habitantes desta
zona populosa. São adolescentes e jovens da faixa etária média de 10 a 15 anos.
Com efeito, de 1990 a 2015, é difícil lembrar subsequentemente todas as
gerações dos grupos armados que se sucederam e que manterem este subúrbio num
clima de grande tensão de conflitos e de violências durante todo este tempo. O
objetivo deste artigo é apresentar e analisar as principais etapas que levaram
à degenerescência social dos conflitos armados e das violências coletivas em Cité Soleil. Par isso, vamos estudar
quatro momentos históricos fundamentais no âmbito dos acontecimentos deste
fenômeno e fazer, para finalizar, um balanço geral do mesmo fenômeno. Mas,
antes de ir direto ao assunto, é fundamental proceder por uma abordagem
sociogeográfica que permitirá ao leitor entender a organização socioespacial,
administrativa e política do município de Cité
Soleil.
1.
Cité Soleil: Sociogeografia e
geolocalização das principais áreas políticas, econômicas e sociais
Por sociogeografia ou geografia social da
violência e conflitos armados devemos entender esta parte da geografia que se
interessa pelo estudo dos grupos sociais nas suas relações com o espaço que eles
ocupam. Este método permite localizar os principais centros em que este
fenômeno estava acontecendo, isto é, suas áreas de comando, de alimentação, de
produção ou ainda de reprodução. Este método é também importante para
distinguir zonas vermelhas daquelas mais ou menos tranquilas. Pela expressão berços de conflitos nos referimo-nos aos
espaços geográficos mais expostos à proliferação dos grupos armados e à
degenerescência das violências. Assim, a disciplina sociogeográfica nos
possibilita de ferramentas para identificar as áreas que reúnem todas as
condições sociais, culturais, políticas, econômicas, psicológicas,
possivelmente, ambientais de surgimento dos conflitos armados e das violências
coletivas sem, no entanto, querer dizer que algumas zonas geográficas são
predeterminadas a estas situações sociais catastróficas.
1.1.Geolocalização de Cité Soleil
Situado ao norte da capital, Porto
Príncipe, a 5,6 km do centro da cidade, o município de Cité Soleil, o
mais populoso de todos os subúrbios da área metropolitana, abrange uma
superfície total de 22 km². Ele se compõe de duas secções comunais Varreux I e
II, trinta e quatro bairros, uma população acerca de 265.072 habitantes,
majoritariamente urbana (IHSI, 2015). A maioria vive numa pobreza extrema com
menos de 1 U$ por dia. Os limites territoriais de Cité Soleil não são
bem definidos e isso engendra conflitos territoriais. Um funcionário da
Prefeitura nós contou um conflito que ocorreu entre as autoridades municipais de
Cité Soleil e as empresas por causa dos impostos e taxas. Além disso, KOTELAM
– uma caixa popular de poupança e de empréstimo – decidiu abrir uma sucursal na
localidade de Damiens, zona norte, em frente da Faculdade de Agronomia e
Medicina Veterinária na parte ocidental do município. Isso provocou uma discussão
violenta entre os agentes por interim deste município e os dos municípios de
Croix-des-Bouquets e de Tabarre a fim de determinar qual autoridade municipal
deveria cobrar desta instituição o
pagamento das obrigações tributárias. Casos como conflitos por
competência territorial, competência jurídica e competência judiciária são
muito frequentes na sociedade haitiana. As autoridades governamentais
competentes têm que resolver este problema.
Além disso, indústrias, empresas, residências,
lojas e centros comerciais que, segundo as delimitações territoriais, deveriam
estar sob a jurisdição de Cité Soleil, são cobrados pelos agentes
fiscais de Tabarre ou de Croix-des-Bouquets. Daí um conflito territorial que
não é nem silencioso nem barulhento, mas presente no cotidiano social e
político das autoridades e está acontecendo por causa de uma desordem
generalizada na delimitação das comunas. No entanto, ele não preocupa ninguém
tampouco os governantes. Alguns dos municípios foram criados por causas
essencialmente políticas, ideológicas e afetivas para agradar uma população ou
satisfazer um grupo peculiar sem que estes respondam aos critérios de
infraestrutura e às condições sociais e ambientais necessárias.
Uma explicação deste problema se encontra
na Lei de 2002, criadora do município de Cité Soleil e emendada pela Lei
de 2004 sob o governo de transição. Ambos as leis têm uma falta enorme de
clareza sobre as zonas e bairros que pertencem ao município de Cité Soleil
e seus limites territoriais bem definidos. No entanto, de acordo com a Lei de
2004, Cité Soleil está limitada ao norte pelo rio cinzento e Damiens, ao sul por Carrefour Aviation – recentemente renomeado Carrefour Jean-Jacques Dessalines
cujo decreto é desconhecido –, ao este por Wharf
Jérémie e a baía de Porto Príncipe que se estendem ao longo dos mares até
Wharf e o Mar do Caribe passando por Bélécou, ao oeste por Delmas, Simon Pelé, Cité Militaire e estrada do aeroporto Toussaint Louverture onde se concentra o
parque industrial.
1.2.Cité Soleil e suas principais instituições da
administração pública
As zonas mais afastadas como Sarthe,
Terre-Noire, Blanchard, Rapatrié e Duvivier – para citar apenas
algumas – são, aparentemente, percebidas como áreas rurais da comuna habitada
por indivíduos com capacidades econômicas muito médias. Mas, na verdade não
são. Esta abordagem sociogeográfica de Cité Soleil está nos permitindo
compreender que, apesar do empobrecimento, da miséria e da reputação de zonas
de violência e de conflitos, este município não é violento em sua totalidade,
globalidade e integralidade, isto é, a violência e o conflito intergrupos se
distribuem entre uma dúzia dos 34 bairros que o compõem. Trata-se então de um
terço do município que se mergulha nos conflitos intermitentes sem contar os
casos isolados de violências conjugais, sexuais, de gênero não repertoriadas
noutros bairros menos conflitantes. É uma representação de 35,29 % da
superfície total do munícipio. É muito por um município tão pobre,
economicamente dependente das receitas do Estado central e não criador de
riquezas e de empregos. E, como veremos mais adiante, mesmo dentro desses
berços de conflitos, há zonas mais beligerantes e guerreiras do que outras. Por
causa da história violenta, influência social, afluência, quantidade de
soldados, capacidade de lutar, número imponente de grupos armados, um bairro
pode, naturalmente, impor sua vontade a outro.
Sabemos que no espaço urbano se concentram
o poder público, político e administrativo, as atividades sociais, econômicas,
culturais, educativas e artísticas com maior alcance e intensidade, onde se encontram
as universidades, os grandes centros comerciais, hospitais, bancos e meios de
comunicação, onde a mobilidade social é mais intensa, onde a maior parte da
vida social, econômica, cultural e política dos indivíduos está agitada. O caso
de Cité Soleil é um pouco diferente: sua ruralidade e sua urbanidade se
confundem. Não tem como separar geograficamente o urbano do rural e vice-versa,
como isso acontece para Gonaïves, Cap-Haïtien, Cayes, Jacmel e
Croix-des-Bouquets. O município é quase 100 % urbano. Com isso, os habitantes
de Cité Soleil vivem no coração das áreas urbanas e não têm, absolutamente,
nada assemelhado a uma vida rural propriamente dita.
Com efeito, Sarthe e Cazeau são,
praticamente, percebidas não como zonas rurais, mas como áreas urbanas recuadas
das zonas conflitantes e, além disso, designam o local do poder político e
administrativo, da Subdireção Geral dos Impostos. Mas, as atividades comerciais
(grandes ou pequenas) se concentram entre Wharf Jérémie, Wharf, Carrefour
Aviation, Damiens, Station Gonaïves e o mercado comunal de Brooklyn
sem contar os vários pequenos negócios informais dispersos aqui e ali. Assim,
embora não seja fácil distinguir entre rural e urbano, embora o município
esteja localizado na periferia norte de Porto Príncipe com o mar caribenho por
limite, apesar das dificuldades de situar claramente seus limites geográficos,
apesar de não poder identificar grandes centros comerciais, culturais e artísticos,
finalmente, apesar de ter um comércio informal dominante, o município permanece
um espaço muito urbano. As violências coletivas e os conflitos armados que ele
está sofrendo são também urbanos e se concentram em alguns bairros específicos.
A administração municipal é instala então
em Sarthe, localidade do noroeste menos exposta aos conflitos armados
frequentes e repetitivos. Pelo passado, esta administração estava no centro das
zonas conflitantes entre Cité Lumière – alvo de vários ataques – e
Boston – o bairro mais beligerante. A razão principal da sua
deslocalização para Sarthe, um bairro mais seguro, tem a ver com os
perigos iminentes dos conflitos armados.
O Tribunal da Paz e o Oficio do Estado Civil estão na zona sudoeste da Estrada
Nacional # 1. Nesta mesma estrada Nacional # 1, há, ao sul, a encruzilhada do
cemitério de Drouillard, ao norte a estação Gonaïves – uma
espécie de rodoviária como no Brasil. Ambos são munidos de uma delegacia de
polícia. Ao lado de uma torre de água na parte leste da entrada da comuna se
encontra uma subdelegacia de polícia, alvo de numerosos ataques violentos por
indivíduos armados. Pelo Boulevard des
Américains, também conhecido como 4 encruzilhadas ou Route 9, há, um pouco mais ao leste, escolas e instituições
religiosas, entre as quais a Igreja Católica da Imaculada Conceição e a Escola Primária
Nacional de Cité Soleil, ao oeste a Escola Secundária Nacional de Cité
Soleil até o mar onde se encontra o Wharf equipado também de uma
outra subdelegacia de polícia e uma única instituição mediática: Rádio Boukman.
Na parte sul de Boulevard des Américains, encontramos o recém-renovado Wharf
Jérémie e o cais onde os barcos se acostam e as companhias de petróleo aprovisionam-se
em gás a acerca de cem metros de Bélécou – um subúrbio do sudeste de Cité
Soleil. Ao norte está o antigo mercado comunal transformado em uma base
militar pela Minustah, onde também estava localizada a única delegacia de
polícia. Atualmente, todo o espaço é ocupado pela Unidade Departamental de
Manutenção de Ordens (UDMO) – uma das unidades da PNH – vista a retirada
progressiva desta força da ONU. Finalmente, mais ao norte em direção à Côtes des Arcadins, Route 9, há uma terceira delegacia de polícia localizada entre Rapatrié,
Truitier e Duvivier, ao noroeste do município.
1.3.Geolocalização das áreas de conflitos armados
O cruzamento Boulevard des Américains ou Boulevard
Soleil, é também chamado 4 cruzamentos porque permite localizar os 4 pontos
cardinais de Cité Soleil do norte ao sul, do leste ao oeste passando
pelo centro, e ter uma visão global da zona. Este cruzamento é extremamente
estratégico pelas seguintes razões. Inicialmente, este cruzamento conecta Cité
Soleil com os dois principais polos atrativos do país: polo norte
considerado como pulmão turístico do país e polo sul onde se encontra os
centros comerciais e as companhias de petróleo. Em segundo lugar, desde a
fundação de Cité Soleil, este mesmo cruzamento divide o espaço de
conflito do município em duas partes ampla e categoricamente opostas e
antagônicas, a saber, Alto-Soleil e Baixo-Soleil onde o alto
representa a zona superior ao leste e o baixo a zona inferior ao oeste.
O terceiro fator é que este cruzamento
constitui desde sempre o centro dos conflitos intermináveis entre nèg anwo kont nèg anba, das
confrontações violentas entre grupos armados e policiais. É, portanto, a
fronteira virtual e real que separa as principais zonas de conflito. O quarto
aspecto estratégico desta encruzilhada é o fato de simbolizar a área central
das atividades comerciais onde tem o maior mercado público do município.
Historicamente, além dos vários confrontos violentos entre as bandas armadas rivais
nos últimos vinte anos, foi neste cruzamento que, pela primeira vez, uma
multidão em júbilo celebrou sua suposta
vitória sobre os policiais em 1995, quando o famoso “Exército Vermelho” foi criado
(FABIEN, 2017, p. 23-24). O Alto-Soleil está localizado na zona leste do
Boulevard des Américains e se estende
até Bélécou passando por Soleil 6, Haut-Boston e Bas-Boston, 3BB,
1º e 2º Cité, Cité Lumière, Rue Volcy, Croix Bleue e Projet
Drouillard. O Baixo-Soleil começa a partir do mesmo Boulevard des Américains na zona oeste,
desce para Wharf, cobrindo as áreas como Brooklyn, Soleil 4, 13, 15,
17, 19, Ti Haiti, Projet Linthau 1 & 2, Cité Gérard, Bois Neuf[1].
É nesta divisão que se encontram localizadas as diferentes zonas que constituem
o núcleo dos centros de violências coletivas e de conflitos armados em Cité
Soleil. Devemos sublinhar que os fenômenos de tal envergadura em Cité Soleil são concentrados neste
espaço altamente urbano, principal centro de interesses dos grupos armados.
Se for preciso recortar este mesmo interior
desta área sociogeográfica de conflito, vamos ver que, de um lado, existem
alguns pontos estratégicos de conflitos como, por exemplo, este famoso cruzamento
Boulevard des Américains, Carrefour Million que separam Bois Neuf e Projet Drouillard, sem
esquecer a estrada Nacional # 1 da zona norte em frente de Boston, que as
pessoas chamam também Carrefour Boston. Do
outro lado, existem algumas zonas mais violentas do que outras, ou seja,
aquelas que têm os grupos armados mais perigosos e em que as rivalidades
violentas são mais frequentes. Estamos falando dos bairros como Boston, Bois Neuf, Soleil 17 e 19, Projet
Drouillard, Cité Lumière, Ti Ayiti, Cité Gérard, Brooklyn, Bélécou, que, desde início, fazem parte
da lista preta das localidades de proliferação dos grupos armados.
Se cada bairro tem sua própria banda
armada, é para proteger e defender seus interesses, ter sua parcela do bolo
quando necessário, não se submeter à boa graça dos outros, por fim, poder
controlar seu próprio espaço. Cité Soleil
é um espaço de rivalidade e de competição entre os grupos armados que buscam
controlar este espaço. Ele representa um grande centro de interesse econômico
para eles e para os políticos e empresários que os utilizam para criar
insegurança e instabilidade quando estiveram insatisfeitos de um regime. Às
vezes, eles não precisam de um apelo dos manipuladores, eles podem criar sua
própria insegurança quando estiveram também com raiva contra esses
manipuladores. Enfim, Cité Soleil é
um circulo vicioso de violências e de conflitos que permite entender como um
sistema de exclusão social funciona assim como o paradoxo da sociedade
haitiana, produtora de pessoas violentas e criminosas.
Mesmo se às vezes as violências e os
conflitos assemelham a uma loucura mortífera, uma criminalidade de alta
intensidade, uma guerra fratricida infinita, ou, pareçam desnecessários e
híbridos, eles escondem importantes interesses sociais, econômicos, políticos e
financeiros tanto para os atores como para os manipuladores intelectuais. Seria
um erro grotesco acreditar que esses jovens são loucos para se matar entre si
por nada. Esses interesses não são coletivos, mas individuais ou pessoais. A
violência se torna uma espécie de competição entre os diferentes grupos armados
a fim de obter sua modesta porção em detrimento do resto da comunidade. Daí a
perigosidade de morar e frequentar essas localidades. Assim, o habitante de Cité Soleil é como um prisioneiro da sua
própria residência. Uma exclusão social total do resto da sociedade.
Acabamos de demonstrar que as violências
coletivas e os conflitos armados se concentram nas áreas urbanas estratégicas –
as mais pobres, insalubres, inacessíveis e vulneráveis do ponto de vista
ecológico e ambiental – controladas por sujeitos armados. Abrangendo uma grande
parte da comuna, essas dezenas bairros – mesmo que simbolizem o bastião dos
conflitos armados – não são a representação exclusiva da cidade inteira. As
áreas menos conflitantes, como Sarthe,
Terre-Noire, Blanchard, Rapatrié e Duvivier – para citar apenas algumas –
não são, no entanto, totalmente, livres de violência social. As últimas
rivalidades intergrupos de 2015 opuseram Bois
Neuf e Projet Drouillard no espaço
chamado Carrefour Million. Assim, as
violências e os conflitos acontecem, geralmente, nas áreas sociogeográficas
mais pobres de difícil acesso às forças policiais. Vamos agora estudar cada
geração desses conflitos com suas características sociais.
2.
As
diferentes gerações de conflitos armados em Cité
Soleil e suas particularidades sociais
As primeiras situações conflituosas e
violentas começaram em 1967, data da fundação da cidade e se estenderam até
1986 quando o ditador Jean-Claude Duvalier era compelido de abandonar o poder
sob as pressões populares para se exilar na França. O segundo momento vai de
1987 a 1994, marcado, na escala nacional, por golpes militares sucessivos e
perseguições políticas, em Cité Soleil,
pelo surgimento daquela famosa organização chamada «Exército Vermelho» e
altercações frequentes entre policiais e civis na madrugada do golpe de 1991
contra o presidente Aristide. Esta segunda geração de conflito e de violência
se termina com o retorno em 1994 do mesmo. A terceira geração abrange o
quinquenal do presidente Préval até o período da reeleição, em 2001, do Sr.
Aristide nas eleições de 2000 vigorosamente contestadas pela oposição e por
vários setores da sociedade política. Enfim, o último momento – o mais longo de
uma duração de 14 anos – começou exatamente a partir do segundo mandato
presidencial do Sr. Aristide em 2001, e se estende até o final de 2015.
Cada
uma dessas gerações tem suas particularidades sociais. Se a primeira era de
ordem interpessoal e interindividual por causas extremamente ligadas às necessidades
sociais e alimentícias primarias, a segunda era fortemente dominada por
caráteres políticos. Na terceira geração, os conflitos armados e as violências
coletivas eram menos agitadas entre os grupos e as forças policiais. Isso pode
ser explicado pelo comportamento e temperamento do presidente Préval que era um
homem muito pacificador. Mas, as coisas se pioraram nos anos 2000: as
rivalidades entre grupos armados se
intensificavam, surgiram as OP que se confundiam com os grupos armados, as
violências sociais aumentaram consideravelmente, as confrontações violentamente
físicas entre bandas armadas e policiais se tornavam uma rotina. 2004 a 2007
corresponde ao período da grande turbulência na escala nacional de uma
paralisação quase geral das atividades em Cité
Soleil.
2.1.Primeira geração de 1967 a 1987: Conflito e
violência de natureza interindividual e interpessoal: Ambiguidade e
pacificidade
As violências e os conflitos sociais que
Cité Soleil experimentou desde sua
fundação até o fim, em 1986, das
práticas ditatórias do regime Duvalier foram, em primeiro lugar, fortemente
marcados pelos seus caráteres interindividual e interpessoal, em segundo lugar,
pela violência política e sexual dos Tontons
Macoutes. Este segundo tipo de violência era geral porque o país inteiro
sofreu dele, então ele não era específico a Cité
Soleil. Todavia, como vamos ver mais adiante, do ponto de vista de
comportamento e de repercussão social, as extravagâncias e os excessos dos Tontons Macoutes tiveram grandes
impactos sobre os jovens que iam formar a geração futura. Queremos enfatizar
aqui os aspectos interindividual e interpessoal dos conflitos e das violências.
É necessário compreender – numa dimensão
sociológica – que esta individualidade e pessoalidade desta categoria de
conflito e violência em Cité Soleil se
ancora no modo de vida social dos habitantes, isto é, situações sociais
domésticas e familiares circunscritas numa esfera microsocial e comunitária sem
caracterização coletiva são fatos sociais normais que ocorrem em qualquer determinada
sociedade humana. De fato, de uma natureza pacífica enganosa, ninguém não
prestou atenção a esses tipos de problemas interindividuais entre famílias,
entre moradores, entre grupos amigáveis da mesma ruela ou da mesma localidade por
causa da distribuição das rações alimentícias, do acesso à água etc. A
probabilidade de pensar numa agravação em nível coletivo desses problemas comuns
era muito reduzida. Embora os indivíduos tenham interesses divergentes e
consigam resolver, pessoal e pacificamente, seus próprios conflitos, nesta
comunidade os problemas sociais permaneciam gerais: educação, emprego, água,
trabalho, saúde.
Esta geração de conflito tem uma
dimensão biológica que consiste, isoladamente, em situação de acesso difícil ou
insatisfatório às necessidades sociobiológicas mais elementares como
alimentação, água, saúde e trabalho. São conflito e violência provocados pela
enorme falta das ajudas sociais que nunca chegam a satisfazer a maioria: a
demanda sempre ultrapassa grandemente a oferta. Há muitos indivíduos com
necessidades sociais e econômicas precárias, no entanto, há muito pouco a lhes distribuir.
O elemento biológico muito dominante se junta ao elemento social que faz com
que não estamos falando de indivíduos com necessidades biológicas isoladas, mas
de indivíduos que têm necessidades sociais comuns e que as manifestam no
momento de distribuição das ajudas sociais cujos desenrolamento e fim alcançam
geralmente alguma violência.
Esta violência interindividual se explica,
por exemplo, pela distribuição desigual das ajudas sociais às populações
vulneráveis, pela preferência de um grupo ou de uma família em detrimento do outro
durante esta distribuição, pelo armazenamento indevido da maior parte dessas ajudas
pelos responsáveis numa intenção de mercantilização das mesmas a fim de
revendê-las no mercado a um preço baixo. Isso ocorre na presença dos pobres
infelizes e frustrados. Ao longo do tempo, as pessoas se tornam conscientes de
serem exploradas e usadas como cobaias nestas distribuições
"humanitárias" para que outros se enriqueçam acumulando suas fortunas
em detrimento delas. Tudo isso gerou profundas animosidades na população de Cité Soleil.
Na dimensão social desta primeira
geração de conflitos e violências, temos um povo que, apesar do seu
analfabetismo, estava ciente que luta por necessidades sociais justas e válidas
mas insatisfeitas. Nos ano 80-90, os programas sociais eram frequentes e
organizados através das organizações sociais que serviram de intermediários. Os
representantes dessas organizações conseguiram dialogar diretamente com o
governo quando as coisas se deram mal e defender os interesses da população. A
partir daí, as manifestações populares pacíficas constituíam um espaço de
interação sociopolítica, embora, em algum momento, este espaço de diálogo se
tornou surdo e mudo às demandas da população. Portanto, começaram as
deteriorações das relações sociais e políticas, e, ao longo do tempo, a intermediação
democrática não é mais ações coletivas, mas chantagens políticas com sua
pequena dose de violência. Apesar disso, estas manifestações podiam ser
chamadas de movimentos sociais no sentido das argumentações de Alain Touraine
(1968, 1982). Para o autor, movimentos sociais são ideologicamente orientados
para os objetivos que eles perseguem de acordo com sua situação. Não se trata
de multidão sem objetividade e ideologia, mas de ações coletivas orientadas por
ideias e ideologias defendidas num espaço de dialogo e de interação social. É
uma arena socio-democrática que é só possível quando o governo e atores
políticos abrem o debate aos manifestantes e que estes conseguem também
defender suas ideias e seus interesses. É o lugar por excelência de expressão,
de veiculação e de validação das palavras dos mais pobres. Nesta época em Cité Soleil, não há dúvida de que as violências
e os conflitos eram essencialmente a expressão manifesta da insatisfação das
necessidades sociais mais básicas das comunidades, que reivindicaram seus
direitos cumprindo seus deveres democráticos, saber, os movimentos sociais.
Nesta época também, no espaço sociopolítico as organizações sociais eram
fortes.
Estamos concluindo esta primeira parte
com uma breve explicação do aspecto pessoal e interindividual caracterizado por
conflitos isolados entre pescadores, violências fracas entre famílias, discussões
agressivas entre pessoas nas localidades de acesso a um serviço comunitário e público, a água[2],
por exemplo. Os conflitos e as violências poderiam ocorrer também por
causa de uma criança turbulenta ou rude. Nas longas filas de atendimento aos
kits alimentícios distribuídos pelo Centro de Desenvolvimento Social (CDS) de
Réginal Boulos ou pela organização de patrocínios do Padre Lanaud ou Bonnhen,
as violências e os conflitos eram também frequentes. Nessas filas, pequenos
empurrões, brigas, querelas, grosseiras surgidas acidentalmente entre as
pessoas poderiam levar a conflitos interindividuais e até interfamiliares
indefinitos. Não deveria ter vergonha de dizer que em Cité Soleil nesta época
as pessoas poderiam se matar por uma caixa de leite ou por um pedaço de pão,
tão a situação social era catastrófica.
Uma simples agitação em uma longa fila
de atendimento durante a distribuição de alimentos, pequenos mal-entendidos por
causa de uma mulher, criança, animal ou objeto valioso poderiam gerar ódios
contínuos, porque nesta pequena comunidade de onde iam emergir alguns surtos de
conflitos armados, todos se conheceram. Essas situações socio-individuais eram
até lá impermeáveis e impenetráveis a qualquer tipo de influência política,
porque foram vistas como coisas normais às quais expõe toda afluência coletiva.
Ninguém ficou chocado. Pois, Cité Soleil constituiu
uma grande família, uma microcomunidade na qual, além dos mal-entendidos
isolados, todo mundo se conhecia, se frequentava, se fazia confiança, se amava,
se ajudava mutuamente, se socorria reciprocamente, se brincava com prazer e
lazer. A vida comunitária era tão bem cimentada nos costumes e hábitos dos
moradores que as querelas isoladas não podiam sacudi-la e eram resolvidas
pacificamente.
2.2.Segunda
geração 1987-1994: A intervenção do elemento político nas situações
conflituosas e violentas, a permanência dos problemas sociais
Se
até o fim de 1986 as violências e os conflitos sociais nos maiores subúrbios urbanos
da capital fossem particularmente de natureza interindividual ou interpessoal,
a partir de início dos anos noventa, estamos assistindo outras formas de
violência e de conflito que começaram a surgir por causa das perseguições
políticas e da caça dos grupos organizados que tentariam resistir aos regimes
militares golpistas dos Attachés, Fraph e
novos adeptos dos Tontons Macoutes de
Duvalier que retornaram à cena política. Estamos lidando a partir deste momento
com a violência política acrescentada aos conflitos interindividuais e
problemas sociais não resolvidos. A degenerescência das violências e dos
conflitos sociais da segunda geração era o resultado da insatisfação das
necessidades sociais e econômicas básicas dos habitantes da comuna desde sua
criação. Tais necessidades vêm a ser pioradas pelos fatores políticos, porque
tudo se torna politizado até a miséria e a pobreza do povo. Tudo se reduz a uma
espécie de politicaillerie haïtienne,
ou seja, à corrupção e à traição. O que complica tudo. Inicialmente, a
violência política era manifestada até sob a forma de medo provocado só pela
presença dos Tontons Macoutes. Com os
Attachés, Fraph e novos Tontons Macoutes ela era muito visível
através das perseguições políticas sem esquecer com certeza todas as condições
sociais infra-humanas anteriores.
O
fato de que os políticos se convidam autoritariamente nas festinhas da miséria
e da pobreza dos mais vulneráveis, nas rivalidades interpessoais sem trazer nenhum
plano de mudança e de solução concreta, criou nos espíritos a confusão total
entre o social e o político. Em outras palavras, as perseguições políticas que
vêm acrescentando às situações de miséria, pobreza, desemprego e analfabetismo
dos jovens, os incitavam à violência como expressão de demanda, de reclamação e
de aspiração à uma vida melhor. Os problemas sociais não resolúveis vêm sendo recuperados
pela política como um vírus, que se expressava pelo meio das perseguições.
Esses problemas abriram o caminho para a produção de outras violências em
paralelo às violências e conflitos sociais anteriores e também à politização
dos mesmos. A política, ao invés de trazer soluções, vem corromper e obstruir os
programas sociais que deveriam atender os desejos dos habitantes de Cité Soleil.
Estamos
no coração do período pós-ditatorial duvalierista até o retorno de Aristide, em
outubro de 1994, marcado por uma categoria de violências administrada sob forma
de repressão política pelos governos (militares ou golpistas) provisórios
sucessivos e por conflitos interindividuais que se transformaram em conflitos
intergrupos. A violência política é amiúde estatal e orquestrada pelo exército[3] contra seu próprio povo sob as ordens
dos governantes. Esta originou-se mais recentemente da ditadura de Duvalier que
mudou completamente a configuração social e política do Estado criando um
Estado contra a Nação. Um Estado que confunde Estado e Nação, que mistura
interesses privados e interesses públicos, que não diferencia Governo e
Executivo (TROUILLOT, 1986, p. 173-175). Um estado violento contra um povo
inocente, indefensível e covarde que está querendo satisfazer seus desejos sociais
preliminares. Os novos regimes militaro-golpistas não romperam totalmente com
as práticas violentas do sistema de tortura duvalierista.
Foi
a partir deste instante que começamos a assistir uma proliferação e
multiplicação de pequenos grupos armados nos subúrbios do sul (Martissant, Fontamara), sudeste (Bel Air), norte (Cité Soleil) e nordeste (Simon
Pelé, Delmas 2). Excepcionalmente, em Cité
Soleil, falava-se de «Exército Vermelho» como organização criminosa e
terrorista. Entre 1990 e 1994, animosidades, ódios, frustrações, inimizades,
conflitos intergrupos, insatisfações sociais acumuladas, violências coletivas
entre os jovens numa sociedade fraturada aumentaram consideravelmente barreiraram
os avanços sociais. O retorno de Aristide em 1994 era muito solicitado nos
bairros populares na esperança de mudar alguma coisa e significava para os
moradores dessas localidades não somente uma vitória à resistência, mas,
sobretudo, uma mudança das condições sociais e econômicas. Nada disso ocorreu.
As decepções do povo aumentaram cada dia e assim a comunidade de Cité Soleil estava caminhando para a
politização dos conflitos.
2.3.Terceira
Geração 1994-2003: O início da politização dos conflitos armados e das violências
coletivas em Cité Soleil
Aquele
famoso «Exército Vermelho» que, aparentemente, teria nascido nas lutas sociais
e políticas pelo retorno de um governo constitucional e legítimo no qual se
insere a continuação e a terminação do mandato presidencial de Aristide
interrompido em 1991, se ampliou e se tornou um instrumento político eficaz nas
mãos dos atores políticos que vão aproveitar da sua existência para politizar
melhor os conflitos e as violências ao invés de resolvê-los. Este retorno não
significava o fim desta organização. Ao contrário sua politização criou uma
estrutura mais oculta: as Organizações Populares (OP) constituídas majoritariamente
dos partidários do partido Fanmi Lavalas.
Nesta geração diversos fenômenos aconteceram, mas o surgimento das Organizações
Populares era o mais importante porque ao longo do segundo mandato de Aristide
as OP – uma espécie de estruturas embrionárias dos grupos armados – se opuseram
à uma parte da sociedade política, em particular, ao setor da oposição. Nos
distritos populosos e contaminados pelo movimento Lavalas, as OP eram o braço direito do regime.
Elas
começaram a ser perigosas e embaraçosas pelo próprio regime que não tinha a capacidade
de desmobilizá-las nem a capacidade de controlá-las porque elas se tornaram
cada vez mais descontroladas e indomáveis. Por conseguinte, elas provocaram uma
situação de instabilidade política tanto pelas suas ações violentas contra os
oponentes do regime quanto por sua insatisfação expressada nas manifestações populares
marcadas pela violência. O regime Lavalas
começou a se torna desconfiável e contestável. Elas começaram a se desconfiar
nele, mas sem romper as relações com ele.
O que ia criar uma degenerescência social progressiva dos conflitos até a
demissão forçada do presidente Aristide em 2004. O município entrou assim numa
fase mais intensificada de violências coletivas e de conflitos armados. O nome dado a este momento histórico
era Operação Bagdá de 2004 a 2007,
que pode ser chamada também a grande tribulação de Cité Soleil.
A
administração de Préval no âmbito do primeiro mandato (1996 a 2000) era
praticamente paralisada e aparentemente pacifista. Porque, de um lado, ele era um
personagem da visibilidade política, no entanto, quem estava realmente no
comando era seu mentor político, Aristide. Na teoria, ele tem o mandato
constitucional e legítimo do povo, porém, na prática quem comanda é o outro.
Sem autonomia de governança, o presidente que chegou ao poder em fevereiro de
1996 era uma espécie de marionete nas mãos dos burocratas do regime Lavalas. Ele dirigiu o país respeitando
o princípio de gratidão por dever tudo a este partido político do qual se
afastou totalmente no segundo mandato em 2006. Cité Soleil, neste período, era aparentemente pacificada, mas na
verdade era como uma região muito esquecida do país. Para ele, o mais
importante é assegurar o segundo mandato de Aristide em 2001, então a
responsabilidade principal de Préval era manter as zonas violentas e
conflituosas numa pacificação aparente, porque no fim dos anos 1994, as
violências coletivas e os conflitos armados nos bairros populares tendiam a aumentar.
Em resumo, o jogo político consiste em projetar uma aparência de democracia e
abertura do regime. Mas, tudo isso se inscreveu num conservadorismo do poder
pelo partido Lavalas. É por isso que
durante esse quinquenal, o país conheceu os momentos de imobilismo social,
econômico e político mais tristes aos quais se acrescentou o aumento da
insegurança até as eleições de 2000.
Na
verdade, era uma falsa pacificação das violências coletivas e dos conflitos
armados nos bairros populares particularmente em Cité Soleil. Com
efeito, a chegada do novo milenário foi fortemente transtornada em Cité
Soleil pelos conflitos que opuseram as localidades como Boston e Rail fazendo dois mortos, seis feridos e 4 casas incendidas segundo
as noticias de Metropole, uma mídia nacional, em 28 de dezembro de 2000. Entre
1995 e 2000, uma centena de pessoas foi assassinada em Cité Soleil por
balas e armas brancas. Em 2001, apesar das contestações da oposição contra as
eleições fraudulentas de 2000, o mundo assistiu a prestação de posse do novo
presidente da república que chegou ao poder num clima politicamente complicado e
socialmente incerto. Em Cité Soleil, as OP se mostravam ainda mais arrogantes
e intolerantes a respeito das pessoas de afiliação política diferente.
A
situação social e política piorou sem nenhuma disposição política de resolvê-la
e sem um ato de denúncia dos atos de violência e de intolerância das OP contra
os membros da oposição. Com efeito, entre 2002 et 2003[4], os membros da oposição
democrática eram os principais alvos desta intolerância popular. As
intervenções do governo eram uma forma de justificação das ações das
organizações populares que se confundiam muito com os grupos armados, porque os
principais chefes civis que faziam parte delas eram sujeitos armados. a
oposição de fortaleceu e ganhou uma boa parte da população que se sentia
profundamente decepcionada, porque até lá não havia nenhuma mudança esperada na
sua vida social e econômica. Começaram então as manifestações populares em
paralelo às organizadas pela oposição contra o governo Lavalas. Num jornal famoso da capital lemos o
seguinte:
Les habitants de Cité Soleil sont au bord de la colère face
à la dégradation de leurs conditions de vies. Ils menacent de lancer une série
de manifestations hostiles au gouvernement (...) Des jeunes, des adultes du
plus grand bidonville de Port-au-Prin menacent de se mobiliser contre le
pouvoir Lavalas. Prise de conscience, déception, frustration, de petits groupes
de résidentes de Cité Soleil grondent. À l´origine de cette grogne, le
comportement du régime qui, selon eux, ne se soucie guère de leur misère. Une
misère qui augmente de jour en jour dans l´indifférence totale des autres
décideurs, font-ils remarquer. Dans le plus grand bidonville de Port-au-Prince,
le vent de la désolation souffle sur les maisonnettes et met à nu toute la
souffrance de cette population: ces jeunes qui ne peuvent pas aller à l´école,
ces adultes qui périssent dans le chômage, ces personnes agées anadonnées à
elles-mêmes et enfin ces enfants qui crèvent de faim[5] (Metropole, de 24 de
outubro de 2001).
As
OP eram formadas por maioria de jovens entre 15 e 25 anos oriundos dos bairros
pobres como Cité Soleil, Fort Mercredi,
Martissant, Bel Air, Solino, La Saline, e por aquelas chamadas no Haiti,
crianças de ruas de acerca 10 a 12 anos. E, como o governo nunca se posicionou
ou se afastou claramente das violências cometidas pelas OP, que sempre foram
consideradas como um instrumento político do governo para reprimir todo tipo de
oposição, então ele foi severamente criticado por isso e se colocou
pessoalmente numa situação política muito inconfortável. Já estamos numa fase
muito avançada da utilização e da instrumentalização política dos grupos
armados pelo setor político dentro do poder e fora do poder, e isso ia à
degenerescência total. Porque esses grupos paramilitares que teriam alguma
relação com o governo se tornam descontroladas para este mesmo governo. Sem que
os problemas sociais e econômicos anteriores nunca sejam aprimorados em Cité
Soleil, a partir dos anos 2003 entramos na etapa mais exagerada e perigosa da
politização sistemática dos conflitos armados e das violências coletivas em
Cité Soleil e em La Saline que,
na época, eram consideradas como o bastião das OP. A instrumentalização dos
grupos desfavorecidos a fins políticos incitando-os à violência, aos conflitos
internos entre eles mesmos criou uma instabilidade política monstruosa no país
até o acontecimento daquela Operação
Bagdá em 2004 que anunciou, por conseguinte, a última geração pela qual Cité Soleil passou antes de chegar hoje a
este momento de autopacificação e autoneutralização dos conflitos armados intergrupos.
2.4.Quarta
geração 2004-2015: Operação Bagdá: Cité Soleil como centro da amplificação e
extensão das violências coletivas e dos conflitos armados
Se
olharmos um pouco para trás na história do Haiti, podemos constatar que o país
se acostuma a começar seus novos séculos com eventos esquisitos que decepcionam
sua relevância histórica mundial. Se o século XIX começou com o assassinato do
líder principal da independência em 1806, Jean-Jacques Dessalines, no século XX
o país ia conhecer a humilhante ocupação norte-americana em 1915. O século XXI
que deveria comemorar o segundo centenário da nossa independência foi dolorosamente
afetado por manifestações populares intensas sob as pressões das quais Sr.
Aristide se demitiu e não somente surgiu aquela Operação Bagdá em 2004, mas também o país caiu sob a dominação de
um exercito multinacional. Entendemos por Operação
Bagdá o período de alta violência generalizada, entre 2004 a 2007, entre
grupos armados e policias e caracterizado pelas confrontações violentas e
conflitos intermitentes entre grupos armados nos bairros populares chamados
zonas vermelhas. Era um dos momentos mais difícil na vida do povo haitiano no início
do século XXI. Esta situação paralisou quase a totalidade das atividades
sociais e econômicas e dividiu o país em dois blocos completamente
incomunicáveis: Norte e sul. Cité Soleil no centro era não frequentável e
inabitável.
Muitos
elementos sinalizadores demonstravam que estávamos caminhando para esta
degenerescência dentre os quais gostaríamos enfatizar alguns: armamento
clandestino, invisível e cúmplice dos grupos em Cité Soleil, falso
programa de desarmamento e de desmantelamento dos grupos armados e dos antigos
membros do exército, proliferação das OP e sua superpotência, posição
partidária do governo a respeito das OP, mistura e confusão entre OP e grupos
armados, politização da polícia e fragilização das outras instituições estatais
como, por exemplo, a justiça. Com efeito, em fevereiro de 2002, sob a direção
do presidente o governo encontrou os chefes OP no palácio nacional (Metropole,
27 de fevereiro de 2002). Até hoje, ninguém sabe o que foi dito nesta reunião
na qual participavam as OP de Cité Soleil. A questão é como um chefe de
estado pode decidir encontrar indivíduos considerados pela polícia e pela
justiça como bandidos? Após este encontro, nos dias seguintes, ocorreu o
assassinato de uma policial que criticou esta iniciativa, o aumento constante
das violências, a agravação das rivalidades intergrupos nos bairros populares
inclusive Cité Soleil, um desrespeito absoluto dos membros OP para os
policiais até que um deles muito influente tenha ameaçado um comissário de
polícia pelo súplice da coleira. Em termos cronológicos, a Operação Bagdá começou nas vésperas de 2003 quando as confrontações
violentas entre OP e grupos de estudantes se intensificaram. Este momento era chamado
também Operation bouclier, uma forma de apartheid em todo sentido: 1. territorial
entre zonas altas e zonas baixas, zonas burguesas e guetos; 2. social entre
estudantes e quimeras; 3. político entre oposição e partidários do governo;
enfim, 4. econômico entre ricos e pobres, entre empregadores e empregados. Era
a época da grande apologia do ódio e da violência.
Desde
as eleições de 2000 que marcaram a entrada na posse, em 2001, de uma nova
administração, o país começou a ser muito agitado por, de um lado, diversas
protestações contra o governo que vários setores da sociedade política consideravam
como ilegítimo e imoral porque roubou as eleições, mas, do outro lado, pelas
manifestações dos partidários do governo para apoiá-lo. A situação vai se
tornar muito pior quando, em 2003, o grupo da oposição decidiu descontinuar
todo tipo de discussão com o governo e entrou numa fase de radicalização da sua
luta e chamou seus partidários e a população inteira à desobediência civil.
Isso ocorreu após a oposição ter sido convencida claramente da não vontade do
governo de dialogar e de resolver o problema das OP que, além de ter sido muito
crucial e sério, era uma das principais condições da oposição para retomar as
discussões com o governo, porque as OP se tornaram cada vez mais arrogantes,
violentas e insuportáveis. Temos duas situações complicadíssimas. De um lado,
as OP que, não sendo distintas das bandas armadas, não ajudavam seu próprio governo
ao provocar tantas violências e confrontações e agressões contra os membros da
oposição e a população civil. Suas ações violentas e intolerantes eram contrárias
ao jogo democrático e enfraqueceram seu próprio governo. Do outro lado, não
somente o governo nunca definiu uma posição de neutralidade, mas ele se mostrou
também radical a respeito dos membros da oposição.
Neste
contexto, o dialogo político se torna impossível. A crise agravou. Cada parte
está afirmando sua intransigência e sua radicalidade. Enquanto, por outro lado,
os estudantes e os sindicais entram na luta para reclamar a demissão rápida do
presidente, pois, o tempo de negociação e de recomposição do governo acabou.
Nesta fase de radicalização das diferentes partes, que podemos chamar situação de não retorno, as violências e
os conflitos se intensificaram em Cité Soleil. Os chefes de bandas
armadas se mataram entre si. Por exemplo, em março de 2005, um grupo armado
saindo de Projet Drouillard atacou o de Boston. Esta confrontação terminou com a morte do chefe principal
da banda armada em Boston que era do lado da oposição segundo as
palavras do chefe de banda armada de Projet
Drouillard. Eu me lembro desta cena de violência como se fosse ontem. Neste
dia, a banda armada de Projet Drouillard comandada
por um denominado Dread Wilme desfilou na frente da minha casa. Eu podia
ouvir o chefe principal vociferando: “os grupos de Labanière vêm nos atacar e
nos ripostamos atirando neles”. Era para se defender, pois, na verdade, foi ele
e sua banda armada que foram atacar a daquele Labanière, o chefe de Boston na
época. Labanière, um antigo chefe OP, se rebelou contra o regime Lavalas e
se aderiu aos grupos da oposição. E, como Cité Soleil se declara feudo
deste regime, então não pode existir oposição neste bairro. Voluntaria ou
involuntariamente, direta ou indiretamente todo mundo é Lavalas lá. Cité Soleil,
bastião do partido Lavalas, se tornou o santuário dos conflitos sociais
e políticos.
De
fato, a última geração das violências coletivas e dos conflitos armados em Cité
Soleil se caracteriza pela
articulação desses conflitos aos fatores políticos discriminatórios e
partidaristas, ou seja, o procedimento do armamento clandestino por um sistema
político dos grupos vulneráveis da população no objetivo de impedir aos oponentes
puderem se manifestar contra ele. Sem dúvida, é
isso o terrorismo de Estado: uma exploração cruel das condições sociais
precárias dos indivíduos por um regime sanguinário muito pouco preocupado a
resolver os problemas sociais e econômicos que nunca foram aprimorados tampouco
resolvidos. Esta situação de miséria, de pobreza e de vulnerabilidade se tornou
uma fraqueza indispensável para os atores políticos poderem explorar mais
facilmente os jovens.
O
armamento acelerado e invisível dos grupos armados[6] criou uma situação de fortalecimento dos
mesmos que, tendo consciência da sua influência e força, se deixaram
manipulados a menos que tenham o que precisam, a saber, dinheiros, cheques
zumbis, munições e comidas para seus soldados. São jovens entre 16 e 25 anos
que são sistematicamente instrumentalizados para reproduzir a violência em prol
daqueles grupos econômica e financeiramente fortes e poderosos que só podem
resolver seus problemas pela violência. Na verdade, a mão política nunca estava
ausente nos conflitos armados em Cité Soleil desde seu início, porém, ela
nunca foi tão visível, clara, cruel e demonstrativa como no início dos anos
2000. Em 2004, a situação de conflitos armados e de violências coletivas
atingiu um nível inacreditável de gravidade e de exageração em Cité Soleil.
Esta última geração se caracteriza, por um lado, pela frequência e pela
repetição das rivalidades sociais das bandas armadas entre si, e, por outro
lado, pelo agravamento das confrontações entre essas bandas armadas e os policiais.
A polícia – antes da chegada da Minustah em abril de 2004 – desempenhou, apesar
dos seus números limitados e das suas capacidades materiais e técnicas insuficientes,
um papel profissional como única força nacional de interposição entre os
sujeitos armados e os civis. Às vezes, ela atua com brutalidade e arbitrário
para fazer retornar a ordem. Com a chegada da Minustah, as intervenções brutais
e violentas se multiplicavam.
Em
resumo, os fatores explicativos das violências coletivas e dos conflitos armados
em Cité Soleil são múltiplos e complexos e variam de acordo com o
contexto socio-histórico considerado. Se, por exemplo, no início até a década
de 1990, em Cité Soleil, eles eram exclusivamente ligados – sem risco de
se enganar – às necessidades de ordem social e econômica, a partir dos anos
2000, eles são extremamente politizados sem, de modo algum, resolver as
necessidades sociais sem soluções mais duradouras. Ao contrário, elas eram uma
fraqueza muito explorada com maldade. A criação das OP é um dos eventos mais
importantes na politização flagrante dos conflitos armados e das violências
coletivas em Cité Soleil.
Depois vem a Operação Bagdá. Do
ponto de vista teórico, o governo começou a retomar o controle timidamente da
capital e de algumas zonas populares afetadas por este evento a partir do fim
de 2007. Algumas zonas vermelhas como Cité Soleil começaram a serem
frequentáveis após várias intervenções da polícia e das forças onusianas.
Porém, os conflitos armados e as violências coletivas em Cité Soleil não acabaram, mas se estenderam até o
fim de 2015. Uma avaliação estatística das vítimas de todos os fenômenos que
tomaram Cité Soleil como refém,
em particular a Operação Bagdá, é
muito difícil a fazer. Todavia, os traços ambientais e as sequelas sociais que
eles deixaram num Cité Soleil ajoelhado
são ainda muito visíveis.
3.
Balanço
das gerações de violência e conflitos em Cité
Soleil
Essas
diferentes gerações de violências e de conflitos deixaram perdas humanas
inumeráveis e insubstituíveis, danos materiais e ambientais irreparáveis e
incontáveis. De 1995 a 2000, a insegurança e a violência de todos os tipos
custaram a vida à mais que 76 pessoas só em Cité
Soleil (AVRIL, 2000, p. 329-361). O ano 2005 sozinho era responsável por
mais de 77 pessoas assassinadas. O ano mais sangrento em Cité Soleil era
2012 quando acerca de 110 pessoas foram assassinadas por indivíduos armados
(JILAP, 2005, 2012). Em 1993, um fogo devorador destruiu mais do que 1500 casas
e chalés em Cité Soleil, deixando
atrás milhares de famílias sem abrigo e centenas mortes. Em setembro de
2002, indivíduos armados que continuavam a semear a desolação na população
massacraram acerca de 20 pessoas, feriram uma centena de outras e incendiaram
cerca de 500 casas nas confrontações armadas (METROPOLE, 5 de setembro de
2002b).
Esta
situação causou uma degradação monstruosa do meio ambiente de Cité Soleil e impediu a criação do trabalho, por
exemplo, nos setores de limpeza dos canais para criar passagens das águas
diluviais, de urbanização, de saneamento e de reflorestamento. Estes trabalhos
poderiam gerir empregos mais ou menos permanentes, o que melhoraria consideravelmente
a vida econômica de algumas famílias. Com um nível de vida econômica
relativamente melhorada, o indivíduo poderia atender suas necessidades e as da
sua família em matéria de saúde, educação, alimentos, roupas e outros. Mas, foi
observada uma estagnação da pobreza acompanhada de um aumento constante das
vítimas por armas de fogo. Entre julho e agosto de 2005, Cité Soleil
registrou 120 mortes por balas contra 44 com armas brancas de todo tipo
confundido (JILAP, 2005). Isso significa que as violências e os conflitos com
armas de fogo estão em neto crescimento.
É
evidente que, desde 2000, algumas coisas mudaram no que diz respeito à natureza
dos conflitos armados e das violências coletivas em Cité Soleil, particularmente, a configuração sociológica dos grupos
armados. Primeiro, os grupos são mais armados do que antes. Segundo, entre 2004
e 2006, eles estavam reproduzindo uma violência cega contra a população
reduzindo sua mobilidade social e complicando sua vida econômica. Terceiro, as armas
que eles têm na mão não são para brincar, mas para ganhar dinheiro cuidar de si
mesmos e das suas famílias. Por fim, a entrada dos elementos políticos que vem
suplantando os fatores sociais e econômicos anteriores, agita os debates em
torno da complexidade do fenômeno. Conforme mostrado na
tabela abaixo, com base nas estatísticas anuais sobre os atos de violência nas
áreas metropolitanas e em Porto Príncipe da Comissão Episcopal para Justiça e
Paz (JILAP), a violência armada matou muitas pessoas em Cité Soleil. Ao
longo dos últimos 11 anos, mais do que 426 pessoas morreram em circunstâncias
direta ou indiretamente relacionadas às violências e aos conflitos orquestrados
por indivíduos armados. Em comparação ao resto do país, Cité Soleil tem um porcentual de mortalidade por balas de 66,56%.
Uma situação extremamente alarmante.
Tabela de porcentual das vítimas por
balas em Cité Soleil
Ano
|
Vítimas por balas dos indivíduos
armados em Cité Soleil
|
Vítimas por balas dos indivíduos
armados nas zonas metropolitanas
|
Porcentual
|
2005
|
34
|
77
|
44,15%
|
2006
|
3
|
6
|
50%
|
2007
|
5
|
30
|
16,66%
|
2008
|
11
|
30
|
36,36%
|
2009
|
11
|
18
|
61,11%
|
2010
|
71
|
104
|
68,26%
|
2011
|
50
|
59
|
84,74%
|
2012
|
87
|
110
|
79,09%
|
2013
|
68
|
92
|
73,91%
|
2014
|
18
|
26
|
69,23%
|
2015
|
35
|
44
|
79,54%
|
2016
|
33
|
44
|
75%
|
Total
|
426
|
640
|
66,56%
|
Fonte: Comissão Episcopal para
Justiça e Paz (JILAP).
Considerações
finais
A falta de educação, o problema de
autoestima, a demissão das famílias, a falta de inteligência, estão à origem da
manipulação e da exploração política desses jovens abandonados por suas
famílias; expulsados dos bancos escolares; proibidos de entrar na faculdade ou
num centro profissional; privados de lazer e de atividades culturais,
esportivas e recreativas; vítimas de fobia de todos os tipos e em todos os
lugares; desprezados e humilhados no mercado de trabalho devido às suas
qualificações inadequadas; e, finalmente, enganados, violentados em sua moral
por um sistema social corrupto. Assim, eles se tornam uma presa muito fácil. Ao
diagnosticar as situações de violências e conflitos urbanos em Cité Soleil,
podemos resumir as quatro gerações em duas grandes fases interligadas. A
primeira, vista como normal e legítima, corresponde exclusivamente à
insatisfação dos problemas sociais e econômicos da comunidade desde a criação
deste município. A segunda, criticada como anormal e anômica, era caracterizada
pelo aumento cego e exagerado dos crimes entre 2004 e 2007. Os sujeitos armados
são perfeitamente conscientes do potencial deste município, das vantagens de
controlá-lo e da importância dos grupos armados que são um instrumento de
criação de instabilidade e de insegurança quando os setores financeiros,
políticos, comerciais e econômicos que os controlam são infelizes da política
do regime governante. Esta força exterior que os controla é mais constrangedora
e poderosa do que sua vontade de mudar de vida.
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accès le 15 out. 2017.
[1] Desde o processo de paz
encontrado entre os diferentes centros de conflitos e de violências em Cité
Soleil, a configuração social e política mudou praticamente. Doravante, a
cidade é controlada por três grandes polos de bandas armadas. O primeiro tem
seu feudo em Soleil 19, o segundo em Boston e o terceiro em Bélécou. Si o
primeiro controla todos os distritos de Baixo-Soleil e o segundo os de
Alto-Soleil, o terceiro, mais hostil às condições que engendraram esta paz tem
uma atitude isolada por isso não controla nenhum distrito. Cabe compreender,
além disso, que cada um desses distritos é dirigido por um sujeito armado
satélite.
[2] Sobre este assunto ver HOPQUIN, Benoît. La guerre de l´eau à Cité Soleil. Le Monde, Paris, 15 jun. 2007.
Disponible sur: <http://www.lemonde.fr/ameriques/article/2007/06/15/haiti-guerre-de-l-eau-a-cite-soleil_923953_3222.html?xtmc=cite_soleil&xtcr=5>.
Accès le 30 jul. 2017.
[3] O exército haitiano, como
demonstraram tão brilhante e objetivamente, vários autores notadamente Prosper
Avril (1997), Kern Délince (1994), Michel Rolph Trouillot (1986) et Gérard
Dalvius (1987), sobretudo na sua versão pós-ocupacional norte-americana, é uma
instituição criada para açamar e reprimir o povo. Portanto, na origem ela é
anti-povo e anti-nação, e, entre ela e o povo a relação se dá sempre muito mal,
mesmo se do ponto de vista histórico e social os dois são inseparáveis.
[4] No dia 12 de julho de 2003, uma
delegação da caravana de esperança do Grupo 184 veiculando um novo contrato
social foi violentamente atacada com golpes de pedras, pelos partidários do
governo ocasionando quarenta feridos dentre os quais alguns jornalistas (nossa
tradução) (METROPOLE, 29 de agosto de 2003).
[5] Os habitantes de Cité
Soleil estão à beira da raiva diante da deterioração de suas condições de vida.
Eles ameaçam lançar uma série de manifestações hostis ao governo (...) Jovens e
adultos da maior favela de Porto Príncipe estão querendo se mobilizar contra o
regime Lavalas. Consciência,
decepção, frustração, pequenos grupos dos residentes de Cité Soleil ressoam. Em
consonância com este resmungo, o comportamento do regime que, segundo eles, não
se preocupa da sua miséria. Uma miséria que aumenta diariamente com a total
indiferença dos outros tomadores de decisão, ressaltam eles. Na maior favela de
Porto Príncipe, o vento da desolação sopra sobre as casas e expõe todo o
sofrimento desta população: esses jovens que não podem ir à escola, esses
adultos que perecem no desemprego, essas pessoas idosas abandonadas a elas
mesmas, e, finalmente, aquelas crianças que estão morrendo de fome (nossa
tradução).
[6] O processo do
armamento dos grupos armados em Cité
Soleil permanece misterioso. E, mesmo se não disponhamos alguns índices,
eles são, no entanto, insuficientes e menos convencedores para explicá-lo com
tanta objetividade quanto isso exige.